Crônicas

Às vezes, é hora de dar tchau para alguns bons amigos

Vai acontecer com você. Um dia, vai acordar e perceber que todos seus amigos já não estão tão disponíveis como antes. E apesar de manter o mesmo carinho por determinadas pessoas, algumas entram em fases que não combinam mais com nosso estilo de vida. Sim, as pessoas também passam.

A proximidade com os trinta anos tem me mostrado que conforme o tempo corre mais difícil fica manter bons amigos. Um dia, vai estar dividindo uma mesa com uns amigos e perceber que tanto faz você estar ali ou não.

Não os odeie. Com a idade, a disposição para se ver é menor mesmo, tudo parece mais importante que o antigo churrasco despretensioso, o almoço impulsivo no meio da semana ficará mais improvável e até o telefonema inesperado sem assunto será cada vez mais raro.

Por alguma razão insondável, chega um momento na vida que torna-se inviável apenas alimentar um convívio frequente com bons amigos.

Há quem diga que melhores amigos mesmo nunca se distanciam, o que é, em certa perspectiva, uma verdade essencial. No entanto, mais dia ou menos dia tudo ficará diferente entre vocês. Nunca saberão explicar o que exatamente houve com a inabalável amizade e jamais conseguirão especificar porque não andam mais tão juntos como antes.

Não é falta de amor, mas algo estranho acontece

Você ainda sentirá um carinho especial por certas pessoas, mas quando se der conta, não as terá mais de uma maneira tão acessível. Não adianta culpar as longas aventuras da vida, os afazeres intermináveis do dia-dia, a rotina massacrante ou qualquer outra coisa. Quando ver, estarão em outra frequência.

A partir daí, ficará evidente uma mudança. Quando notar, as pessoas que você conversa sobre seus problemas pessoais com frequência já não são mais as mesmas. Por um momento, aquelas que outrora te apoiaram em alguma fase importante da sua vida ficarão arquivadas numa caixinha decorada do afeto, mas não corresponderão mais a aquelas que você liga em caso de emergência — mesmo que elas digam “qualquer coisa me liga”, “Pode contar comigo” e “estaremos sempre juntos”.

No dia que perceber este fenômeno, terá a mais breve e sorrateira sensação de saudade eminente referente a um tempo que ficou para trás, mas vai saber entender que os deveres/faculdade/trabalho/família ou qualquer outra desculpa comum, já tomou a sua mente para te convencer que a ausência de um na vida do outro é um acaso inevitável da vida.

Aprenda a sair de fininho

Não espere ter que lidar com a verdade de que você já não faz tanta diferença na vida dos seus amigos. Quando sentir-se sozinho mesmo acompanhado deles, faça questão de ir embora aos poucos.

Não espere alguém fazer questão da sua presença, não deixe com que lembrem de você só em horas oportunas e não se pegue implorando para participar de algo que estejam promovendo para entender que é hora de ir embora.

Não espere com que você não faça mais tanta falta como antes ou que se flagre apenas como mais um componente em um grupo dinâmico de pessoas com alguma afinidade para chegar a conclusão de que deu o tempo naquele grupo.

Aprenda que não é maldade deles, mas que um dia, seus amigos não farão mais questão de você. E tudo bem. Nesse dia, não os julgue. Apenas os ame como uma parte boa da sua vida.

Há amigos que realmente amamos como irmãos, mas que devido a muitas outras variáveis da vida, não conseguirá mais conviver. Um dia vai notar que, de tempos em tempos, a vida vai te arrancar algumas pessoas na marra e você vai perceber que era hora de ir embora ou de deixar os amigos irem em paz.

É nessa hora que precisa entender que não podemos, por mais esforço que possamos fazer, manter todos ao nosso redor para sempre. Troque de amigos no menor sinal de indiferença. Sem medo. Sem se preocupar com o que deixou para trás.

Bons amigos cabem no bolso e não devem estar na enorme bagagem de mão. Não tenha medo de ir embora de algo não recíproco. Há amizades que são genialmente ligeiras. Ser amigo nunca foi questão de tempo, mas de disponibilidade..

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O que não te contam sobre a esperança para o próximo ano

A mesa de happy hour pirateia inúmeros diplomas provisórios de filósofos. Há intelectualidade no fundo de um copo. Não é a toa que este é um cenário comum nos meus textos. O happy hour é o lugar das perguntas. E, igualmente, das respostas mais intrigantes.

Dessa vez, depois de comentarmos como o ano foi bastante turbulento, o questionamento que circulava na mesa era a respeito do que cada um esperava do ano que está entrando. Deixei que falassem primeiro. Fiquei focado em ouvir enquanto pincelava um petisco com a ponta do meus dedos.

Ouvi disciplinarmente as respostas. Eram desde bobagens abstracionistas como “Queria mais paz, mais amor, mais compreensão, mais tolerância entre as pessoas…” até o mais concreto egoísmo do “Quero conquistar <insira aqui um elemento que expressa qualquer sinal de poder, status e dinheiro>”.

Mantive o silêncio intencional. Um amigo, que muito me conhece, provocou: “Vai lá! Diz aí, Mu. Sua vez”. Terminei minha cerveja num gole único e respondi de prontidão: “Nada. Absolutamente nada”.

Entreolham-se com desconfiança como quem esperava mais. “Mas, nadica de nada? Nem um “desejinho” sequer?”, retrucou a garota. Enfatizei: “Nenhum”. O garoto de cenho franzido insistiu: “Mas, não é até meio trágico não ter esperanças de nada?”

Cuidadosamente, repliquei: “Precisamos definir melhor o que é esperança.”

Ele arriscou: “Bem, acho que é você ter planos para o futuro, ter um olhar positivo e esperar que eles aconteçam.”

Enchi o copo e desembuchei: “Acho que olhar para a vida com essa arrogância preditiva, usando uma linguagem positiva e voltada pra si é que está deixando a gente doente da cabeça.

Fiz um pausa para garantir que tinham entendido, molhei os lábios e prossegui:

“A esperança é vital para a existência, claro. Mas, os desejos, estes, estão em outra prateleira da vida. Ela normalmente não está num lugar alcançável, e adivinhem, não estou afim de ficar na ponta do pé procurando por ela. A esperança faz a gente andar, para onde? Quem é que sabe dizer?”.

Quiseram, então saber, qual era a minha esperança para o ano seguinte. Assumi: “Minha única esperança para o próximo ano, é que ele me mude de alguma forma. Que me coloque em movimento, que não poupe de nada e que me surpreenda no imprevisível. Porque a esperança, amigos, não usa das circunstâncias, favoráveis ou desfavoráveis, para existir.”

O ceticismo evidente do mundo

A desconfiança de que a felicidade — seja lá qual for a definição que você assuma para ela — tenha se tornado apenas uma realidade com dimensão totalmente impalpável é realmente uma das percepções desse tempo.

A grande questão do momento é compreender as razões pelas quais a dúvida sobre o alcance de um possível bem-estar está nos levando para um caminho da descrença absoluta e de desconfiança contínua da realidade possível.

Mesmo com este cenário aparentemente desastroso, uma teimosa confiança instintiva em uma expectativa de possibilidade melhorada é, talvez, uma das forças mais fundamentais que sustentam a existência.

Não estou falando de esperança a partir de uma conotação religiosa, mas sim de encontrar uma legítima estrada para trafegar com as nossas crenças-guias como possibilidade do exercício do bem, como oportunidade para revogar a viabilidade da indiferença e fincamos estacas em um terreno absolutamente fértil para não perder-se de si.

A descoberta de si carrega no ser humano a responsabilidade por entender-se como agente causador de certas desordens, mas o encoraja a olhar para o mundo e não distanciar-se dele, mas fazer a escolha consciente de lidar com aquilo que está no seu governo de maneira sensata e de educar-se a asfaltar o caminho pedregoso da inconstância da vida.

Em tempos nos quais o otimismo é o caminho mais fácil — e até, por vezes, glamouroso e rentável — encontramos no percurso contrário do pensamento, uma ideia de que a esperança se desenvolve em um autêntico e marginal ponto de partida:

Da vida, não se pode esperar nada. Exceto o imponderável.

Esperança no banco do réus

Entendo que não custa sonhar com uma vida em que tivéssemos mais coragem de continuar amando profundamente tudo aquilo que o mundo nos ofereceu, mas não sendo assim, diante das falhas, possamos insistir no que realizável.

Penso que seria melhor ignorar a realidade, e perceber uma geração de pessoas que não imploram por atenção num desespero de tentar ser alguém a todo custo, mas que numa sociedade da aparência, possa amar no âmbito privado sem clausulas abusivas e apostar nas pequenas conexões genuínas.

Sinto que seria fundamental que tivéssemos a coragem de defender ideias sem que precisasse considerar um julgamento prévio do outro ou que pudêssemos realmente nos abrir honestamente sobre os sentimentos que nos tomam a mente, mas diante de um cenário diferente, podemos encontrar pequenos lugares de repouso e refúgio para repensar em quem confiar.

Gostaria que apreciássemos tudo o que somos sem ofuscar-se da realidade mais grotesca, sem insistir na tentativa ingrata de demonstrar um falso interesse pelo outro, mas mediante a esse desafio, insisto na coragem de permitir a boca ser um tradutor direto do coração.

Seria maravilhoso acreditar que o bem ainda existe, as pessoas amam-se do jeito que são, que existe verão interminável, que todo mundo realmente quer o bem do outro, de si e do mundo, mas tendo um olhar cuidadoso, podemos optar por lutar pela conexão verdadeira nos pequenos vilarejos de convivência.

Um pouco de esperança para um mundo ruim

O que não tem contam sobre a esperança é que ela nos dá a coragem de ir mais fundo, nos dá o luxo de não contentar-se com a superfície da sua vida, mesmo que seja mais fácil ou mais conveniente.

É a falta de esperança que deixa este mundo com um coração desgastado, machucado por amar, ferido pelo sentir, com a sensação de incapacidade mediante qualquer coisa.

Faça o trabalho duro de não descreditar da esperança, para que tenha juízo de sentar com seus demônios e tomar uma café olhando de frente para eles sem sentir medo, para que não deixar-se de cutucar e escolher curar o que precisa.

Espero que não perca a esperança de vista, para que num futuro, mesmo que tudo pareça não ser do jeito que você pensava ser, que tenha a coragem de mudar e confiar na pessoa que está se tornando.

Há esperança para seu ano, há esperança para todas as merdas que aconteceram, há esperança para tudo que foi perdido temporariamente. Há esperança, inclusive para você.

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Nunca teremos likes suficientes para trazer a felicidade

Deve ter uns dois ou três anos que chegou até mim um e-mail de um leitor me questionando a respeito de uma história horrível que ele havia ouvido de terceiros sobre a suposta razão do fim do meu casamento.

Os fatos que ele me contava eram totalmente inverídicos. Colocaram-me como um sujeito completamente horripilante e grosseiro. Tornei-me, na versão daquele sujeito, um personagem tenebroso e maldoso do qual eu jamais seria capaz de ser. Tinha alguém me punindo por esporte.

Eu estava no avião há muitos pés de altura em direção de uma praia linda. Quando me dei conta de que estava sem internet para responder, me deu um certo desespero e um desejo de estar em terra firme o mais rápido possível.

Constatei um flagrante enorme: Eu estava tão acostumado a ganhar likes que não era capaz de enfrentar, de maneira calma, uma mentira deslavada.

Era como se diante do espelho tivesse que confessar em voz alta que me importava demais com aquilo que as pessoas achavam sobre mim.

Não é mais segredo para ninguém que precisamos de likes para nos sentir felizes e amados. Somos reféns da nossa própria exposição.

Quando penso na minha jornada escrevendo na internet, no tanto de leitores que tive e na quantidade enorme de coisas que pude viver, é impossível não lembrar de três momentos importante que acabaram mudando minha vida, mas também me expondo muito mais que deveria.

Acompanhe comigo até o final do raciocínio.

Antes, uma pequena contextualização…

Aos vinte anos, decidi que ia escrever pequenos textos no meu Facebook — na época em que tinha gente sobrando por lá — colocando alguns pensamentos e ideias a respeito do que eu estava vivendo e pensando naquela fase da vida. Já reparou que o jovem tem um desejo ou desespero ímpar de ser ouvido?

Pois bem, apenas comecei. Fui convidado, ainda na faculdade de jornalismo, por um portal local para escrever crônicas semanais. Era um site cultural pequeno, mas tinha até que um público fiel. Aprendi ali a contar histórias e entreter pessoas com minha escrita criativa.

Esses textos acabaram agradando bastante pessoas de círculos próximos, e, sem querer fui construindo o primeiro grupo de pessoas que gostava de ler o que eu escrevia.

Mais tarde, um amigo, que pertencia a um dos maiores blogs do Brasil na época, me convidou para escrever por lá e dividir um pouco o que eu pensava com outros jovens. Era a primeira vez que eu tinha milhões de leitores e feedbacks de um grande público.

Este projeto durou quase dez anos, até que nos tornamos atarefados o suficiente para não conseguir dar conta do site. Acabamos encerrando uma década de conteúdo formando o pensamento de uma geração inteira de jovens, que hoje, assim como eu, tornaram-se adultos. Ainda fico feliz quando sou abordado por antigos leitores dizendo que o MVC mudou a vida deles.

Quando entrei na faixa dos vinte e mais alguns anos de idade, acabei me casando. Este episódio colocou diante de mim um novo momento de vida e um novo assunto para compartilhar. Junto com a minha ex-esposa, criei um blog para compartilhar um pouco deste novo momento e contar o que aprendíamos sobre viver à dois, sobre convivência e relacionamentos.

Este foi um dos projetos que mais gostei de criar e que também me colocou no mundo como um legítimo criador de conteúdo em série. Acabamos sendo uma referência de casal para muita gente na internet. Tem lá seu bônus, mas ônus inevitáveis. Sem que eu medisse os danos disso, pudemos viver muita coisa por causa desse projeto.

Foram quase três anos de conteúdos diários, e, lidando com milhares de leitores aprendendo o desafio de amar e viver juntos. O Casal do Blog acabou sendo mais um case de como criar conteúdo de valor pode gerar engajamento e influência.

Por causa desse segundo projeto, fui convidado para escrever artigos sobre trabalho, propósito e os desafios da nova geração no mercado dentro da plataforma do Linkedin. Naquela época, estava insatisfeito com meu trabalho e diante de uma nova jornada de me tornar um verdadeiro escritor e viver da sua escrita, comece a compartilhar conteúdo sobre essa temática que foi bastante lido e compartilhado.

Culminou que, junto com o fim do meu casamento, recebi um reconhecimento bastante importante e me intitularam como um dos Top Voice Linkedin no Brasil, que nada mais é do que estar na lista de um dos criadores de conteúdo mais influentes do Linkedin.

Claro que isso me gerou milhares de seguidores, negócios e oportunidades, mas essa exposição me trouxe muito trabalho, e foi esta, a porta mais viável que tive para viabilizar a minha loucura de viver somente de escrita, consegui viajar o país inteiro palestrando, dando aulas e vivendo o sonho de ser um influenciador de verdade.

Até aqui, parece um cenário que muita gente gostaria de estar inserida, mas tenho quase como que uma obrigação te contar umas verdades sobre essa realidade de ser reconhecido nas redes sociais e viver uma exposição para além dos privilégios.

Sobre essa coisa de todo mundo saber tudo sobre você

Diante de todo esse contexto, passei a pensar sobre como toda essa exposição acabou me trazendo muita coisa incrível na vida, mas também acabou gerando um custo mental muito grande.

Não quero nem entrar no mérito se, é certo ou errado, se é vantajoso ou não, se é ingratidão ou não, mas quero realmente filosofar sobre esta ideia de sucesso distorcida que na verdade é a maior evidência de que estamos viciados em viver uma vida de aparência para além da realidade concreta.

Quero começar essa conversa trazendo um personagem bem comum nos dias de hoje. O Instagram tem criado personalidades que tornam-se evidentes por motivos externos, e isso, realmente tem me feito pensar sobre como a gente projeta demais a nossa expectativa na ideia da imagem que construímos. Estamos sempre atrás de audiência e likes como a possível solução para todos os nossos problemas.

Aprendi, com tudo isso que esta realidade pode ser bem nociva para nossa mente e temos que viver como escravo de uma imagem que transmitimos aos outros.

Estamos, por outro lado, de maneira irresponsável, seguindo e empoderando milhares de modelos prontos e simulados de perfis que nos vendem uma falsa ideia sobre propósito, motivação, sucesso, beleza, relacionamentos, saúde e trabalho.

A sensação virtual imagens editadas representam a realidade

As fotos revelam poses montadas, os vídeos são disciplinarmente editados e nada do que colocamos online representa a veracidade completa dos fatos.

Deixamos a refeição esfriar para retratar uma imagem de um prato saudável, fazemos fotos das enormes mesas de pessoas para dizer que temos muitos amigos e somos muito queridos, registramos o treino da academia para ganhar elogios e postamos a capa do livro que nem abrimos para que pensem que somos estudiosos. Tudo filtrado.

Documentamos o pôr do sol que não aproveitamos buscando o ângulo mais perfeito, os sorrisos brancos construídos diante das legendas com letras de música, clicamos o retrato das asas do avião, do copo do Starbucks, da caneca Geek, da mão do companheiro, mas tudo isso é dirigido e montado. Tudo pensado.

Espetáculos para todos os lados

Lembrei por um instante do Gui Debord, autor que escreveu um livro chamado “A Sociedade do Espetáculo” em 1967, descrevendo uma sociedade que vive uma recorrência de espantosos espetáculos construindo personas de si, fantasiando ambientes e vivendo farsas bem realistas. Isso porque ele não fazia ideia de que criaríamos o Instagram.

Ele não fazia ideia de que teríamos um lugar oficial para parecer o que não somos, para enchermos de frases motivacionais que não serve de bengalas emocionais, que viveríamos um momento de palcos montados, inúmeros quilos de vídeos sobre tudo e palestras com pessoas se promovendo como especialistas de qualquer coisa, de enormes álbuns de histórias bobas de superação.

A felicidade tem que estar além dos likes

Foi por isso que fiz uma escolha fundamental. Decidi parar com essa coisa de atrelar sucesso a likes. Isso é viciantemente e nos causa um mal danado. Precisei abandonar o script de alimentar-se de infindáveis fórmulas de sucesso que vivem nas bocas enganadoras de empreendedores de palco.

Não nego que foi importante ter tido a minha fase de ser convidado pra grandes eventos, de ser visto como uma referência de escritor, ter reconhecimento de alguns nichos que sempre sonhei em estar, de ter experimentado um pouco do fruto do meu trabalho de anos. No entanto, passei a ver isso tudo com um olhar mais cuidadoso.

Eu acredito que todo o meu reconhecimento como produtor de conteúdo, não pode ser medido apenas com likes e visibilidade exponencial, mas tive que aprender que meu valor está justamente em não negar que poderia ser a mim mesmo antes de ser aquele cara que todo mundo queria que eu fosse.

Consegui, depois de muito apanhar, entender que não precisava mostrar para todo mundo todos os lugares que eu trabalhava, todas as vezes que recebia um elogio, todo o meu esforço para viver o sonho de trabalhar com o que eu amo. Eu poderia fazer tudo isso que o reconhecimento viria sem forçar a barra.

Comecei a dar mais importância para relações do que para os números. Passei a vender meu peixe apenas oferecendo a coisa certa para as pessoas certas, a trazendo transparência no que eu levo a sério e jamais tentando convencer alguém de que sou bom suficiente, com argumentos exagerados, com números mentirosos, com aparências manipuladas.

A coisa mais importante que as métricas de vaidade

Aprendi a argumentar usando a verdade como a minha principal arma. Essa foi a melhor lição dos últimos anos.

Deixei de lado o impulso de ter que contar ao mundo inteiro sempre aquilo que eu vivo. Agora, posso ir num show sem encher meu stories de vídeos, a memória do meu celular está cheia apenas com imagens importantes, possa ficar um feriado inteiro sem relar no celular, não preciso mais ter a obrigação de registrar cada cada minuto de uma viagem de férias e descansar de verdade.

A lição fundamental é que em vez de ficar com os olhos no número de seguidores, na quantidade de likes, nos views que tenho que superar, posso tranquilamente investir meu tempo e minha energia em coisas muito mais importantes do que na tarefa de manter-me famosinho na internet.

Por onde eu vou, sempre repito: Melhor do que ser relevante, é ser importante.

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Posso só responder um negócio rapidinho aqui?

Eu parei de escrever este texto pelo menos umas dez vezes. Fui obrigado a responder o irritante choro insistente do meu celular apitando como uma criança mimada no chão do supermercado.

Começo outra linha e tenho que clicar para diminuir a chuva de notificações que invade a visão da tela do meu computador como um idoso que reclama da catarata adquirida nos olhos. Se deixo, tenho apenas sessenta por cento da minha tela disponível a cada cinco segundos.

Mas, fique em paz. Já antecipo meu perdão a você porque também sei que, durante a leitura, será tentado a desviar o olhar. São notificações e janelas para todo lado. O modo avião foi a minha única e drástica solução que consegui. Agora, fora do mundo, me sinto no espaço sideral. Distante do mundo acontecendo, mas é pro próprio bem da minha produtividade.

Não tem jeito. Seja qual for o ambiente social que estivermos, lá estará o narcísico e soberbo aparelho celular nos dando suas ordens como o dono de escravos passionais condenados ao cativeiro.

O lugar do celular na vida da gente

Basta notar. Quando estamos com outras pessoas, papeando, pelo menos uma delas estará checando a tela do aparelho como um narcótico desvairado. Conservado e bem nutrido no seu hipnótico sonífero digital na mente.

Veja só o lugar que o celular ocupou na vida da gente. Pela manhã, é o primeiro a dar “bom dia”. No almoço, pode ser o companheiro fiel da distração e do entretenimento. A noite, escolta o nosso sono nos fazendo ninar acidentalmente como a sua presença de uma mãe aplicada. 

Repare bem. Quando não está na mão, está mergulhado no bolso, desfilando com seus pares na mesa ou até disputando concentração com a vida ao lado do para-brisas de uma carro. A onipresença do celular é divina. 

A invenção do smartphone e o seu conceito atual de ser um dispositivo que ocupa o lugar fundamental para a existência deixa o sujeito moderno com a sensação de estar mais informado, de achar-se mais seguro, de manter-se mais comunicável e, por sua vez, de iludir-se que é uma pessoa mais interessantes do que na sua versão secundum naturam.

Muito mais que um telefone

Não sei bem quando foi que percebi que era totalmente preso a realidade dos dispositivos. Bernardo, um amigo que é conhecido pela sua serenidade, num soco de lucidez fez uma analogia incrível: 

Dizia ele que antigamente, as famílias se reuniam nas salas de estar das casas e se posicionavam em frente a lareira para esquentar-se um pouco e ficar um tempo juntos. Ali, tinha um momento para desenvolver a intimidade.

Anos depois, esse hábito foi trocado pelo costume de acompanhar a televisão, deixamos de passar horas encarando os olhos uns dos outros para, então começar a decorar os guias de programação da televisão. O papo diminuiu e talvez tenha sido essa a mudança mais brusca rumo ao individualismo.

Tempos depois, lembrou meu amigo, que a chegada da internet, intensificou mais ainda esse distanciamento entre as pessoas. Passamos a ter uma vida basicamente virtual e individual.

Hoje não há um individuo que não tenha seu próprio mundo na caixa de botões. Até mesmos as vovózinhas de crochês, que viviam penduradas nos muros, abandonaram as fofocas presenciais e estão nos enviando mensagens de texto. Criando seu próprio jeito de usar a tecnologia. 

Por sua vez, cada um vive no seu quarto, na sua cabine, no seu próprio universo, com o seu entretenimento e diante do seu intransferível dispositivo móvel particular. As músicas e filmes, que eram atividades coletivas passaram a ser consumo restritamente próprio. 

Lembro ainda do meu pretérito primeiro celular. Era ainda o tempo em que celular era apenas para realizar ligações e funcionar como um localizador de filhos em tempo real. Eu já tinha pouco mais que quinze anos.

O que perdemos sendo refém do aparelho?

Não sei bem quando foi que me tornei autorizado a ter saudade do tempo em que passou, mas sinto saudade do giros intermináveis durante a discagem do telefone fixo branco da meu avô e das conversas obrigatoriamente curtas que tínhamos que ter.

Trago a nostalgia da emoção de ter que encontrar a lanterna perdida numa gaveta da cozinha em meio a um apagão, de roubar a calculadora profissional do meu pai para terminar o dever de casa mais rápido, de ver pessoas mais velhas lambendo as pontas dos dedos antes de virar a página de uma revista e das palavras cruzadas no jornal de domingo.

Lembro bem de sentir-se importante por preencher mais um nome numa agenda de contatos e tarefas, de abundantemente ver os recadinhos nos blocos de nota pendurados pelos cantos, de invejar jornalistas da TV com gravadores onipotentes.

Me recordo dos senhores de aparência cansada desfilando com seus relógios hereditários, dos frágeis e ensurdecedores despertador de ponta de cama, dos papéis de cartas que as meninas colecionavam nos colégios, dos garranchos indecifráveis da criançada sem Google, dos violentos tapas nas mesas pinball, do cuidado para que o papel manteiga não deslizasse enquanto contornávamos um mapa nas empoeiradas enciclopédias das bibliotecas públicas.

Ainda ouço o narrador estridente que gritava no rádio de bolso do tio Zé enquanto era transmitido um jogo de futebol qualquer, rememoro as longas tardes que eu e meu irmão Nikollas gravávamos um programa de entrevistas ficcional nas fitas k-7 da secretária eletrônica, da emoção em encontrar um CD de uma banda que gostava em promoção nas vitrines das Lojas Americanas

Alimento na memória o rosto do meu pai ao completar a cerimônia de atualizar o Guia Quatro Rodas para viajar, as belas garotas do tempo que na sua infinita credibilidade deixava a gente animado para um sol no final de semana, as inúmeras caixas de fotografias que minha mãe mantinha no último maleiro do guarda-roupa, a tinta de um anotação feita a caneta espalhada pela mão para não esquecer de algo importante e até mesmo o tédio horroroso do mais absoluto ócio adolescente sinto falta.

O celular mudou tudo

 A próxima vez que alguém lhe disse: “Posso só responder um negócio rapidinho aqui?”. Sorria, na verdade, melhor, gargalhe. Tire sarro do esquecimento fatal dele. Não deixe passar a oportunidade de escarnecer daquele que deixou-se levar pela perda do momento.

Lembre-se sozinho, enquanto ele interage com o aparelho, do tempo em que um convite de um amigo para passar tempo junto fazia a gente correr para calçar os chinelos antes que a mãe da gente se arrependesse.

Não julgo se era melhor ou pior, mas naquele tempo, a gente só tinha a presença dos amigos. Por sorte, achávamos um terreno vazio, uma arvore frutífera, um quintal extenso, um brinquedo inventado e mais nada. 

Não precisava de absolutamente mais nada do que a presença dos amigos. Não havia coisa nenhuma que nos tirasse dali. No máximo, a voz enfática de uma mãe gritando nosso nome. O resto, era atenção total aos amigos.

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A importância do sujeito corajoso ainda que petulante

Dessa vez, entro na livraria do shopping com um objetivo certo — a mim, não custa muito passear por ali— mas fui decidido a levar algo do Francis.

Queria entender como era escrever em um mundo onde o jornalismo não tinha assassinado, velado e enterrado a opinião. Paulo Francis é o homem da contra-mão das considerações afiadas que não existe mais.

Todo jornalista tem a obrigação de mergulhar na mente bélica daqueles olhos azuis esbugalhados e esmagados dentro de lentes garrafais por trás do óculos que não perdia um detalhe sequer.

Posto isso, voltemos a cena da livraria. Faço uma caçada minuciosa entre os corredores coloridos sempre portado do meu olhar atento de um garimpeiro experiente.

Dirijo-me à sessão de “Comunicação”. Não encontro nada. Dobro os beiços como quem não entende a classificação do estabelecimento. Insisto um pouco mais diante na prateleira dos “Autores brasileiros”. Mais uma vez, sem sucesso. Penso que talvez, os repositores pensem que um brasileiro emprestado por mais de vinte e cinco anos a Nova Iorque, seja tecnicamente um americano.

Trombo com um livro de um youtuber, que no auge dos mesmos vinte e alguns anos de idade, acreditou que tinha história suficiente para lançar uma biografia. O episódio me faz esbravejar sozinho como um idoso de cãs ralas assistindo ao Jornal Nacional.

Desisto. Vou logo cercando uma vendedora com cara de veterana. Cumprimento-a formalmente e disparo: “O que é que você tem aí do Francis?”. Ela me olha com desconfiança. Talvez tenha passado pela sua cabeça que nem tenho idade para isso. Explico dizendo que sou jornalista. Era como se seu rosto tivesse encontrado sentido.

Ando com ela até a prateleira que dizia “Ciência sociais”. Isso mesmo, o jornalismo de Francis foi classificado quase como um tratado sociológico dos absurdos. Ele próprio rejeitaria o selo, e, sem dúvida, detestaria dividir a vizinhança da estante com boa parte daqueles autores. Veja só, a obra fica, mas o que fazem com ela não há controle algum.

Pego a edição de “A Segunda Mais Antiga Profissão do Mundo” nas mãos. Era, enfim, o que eu buscava. Constato em voz alta: “Nem na capa do seu próprio livro o Paulo sorri”. Inicio uma conversa com a atendente que me conta algumas das suas memórias e episódios do “personagem” de Francis na TV.

Abria um sorriso quando fomos abruptamente interrompidos por umas daquelas adolescentes de trinta anos. Cabelo infausto, blusa de golas recortadas e calças agressivamente fatiadas. Fazia questão de escancarar a rebeldia. Se pudesse tatuaria na testa e em caixa alta a sua revelia.

A moça queria saber de Horkheimer. A vendedora ficou confusa, mas apontou a direção com mão. A menina teve de explicar que precisava ler aquilo para um trabalho da faculdade.

Aproveitou, e com um estranho tom arrogante, destilou todo o seu interesse por um dos pais fundadores da Escola de Frankfurt. Vinha diretamente do fato dela ter acabado de ingressar na universidade. Ela fez questão de dizer.

Depois de uma demonstração involuntária do seu conhecimento adquirido com a leitura de meia dúzia de livro — para não dizer capítulos — pediu o pacote inteiro da escola alemã: Jürgen Habermas, Theodor W. Adorno e Herbert Marcuse.

Folheou durante alguns minutos os livros, conferiu o preço no maquinário e acabou levando apenas o solicitado. O capitalismo não é só um problema ideológico para o estudante, mas sim um obstáculo monetário.

Há essas alturas, com Paulo Francis na mão, senti que se fosse ele no meu lugar, teria tido uma conversa de pé de ouvido com a garota. Um pequeno ataque de provocação. Francis não teria tido a elegância do silêncio que tive.

Não há, em muito tempo, um sujeito que gostasse tanto de ser controverso, questionável, discutível, problemático, duvidoso e contestável do que o Francis. Ele não era apenas um caos, era um pandemônio culto, um rebatedor nato, um engenhoso debatedor.

Até hoje, o jornalismo amarga sua falta. Paulo é uma ausência inestimável. Com seu fim, morreu também o antagonismo. Com sua partida, assumiu-se a inexistência de lados oponentes no jornalismo brasileiro. Todo mundo virou solista de uma nota só. O clarinete barulhento e desafinado do Francis faz uma falta danada.

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Nem esquerda, nem direita. O problema do Brasil sempre foi o canalha

Um dos hábitos mais estranhos que tenho é terminar a leitura de Nelson e iniciá-la novamente. Eu o releio como um folhetim de missa. Nelson não morre.

Poucos escritores falaram tanto sobre o personagem do canalha quanto ele. Sempre que revisito suas crônicas, sou novamente surpreendido por uma nova e brilhante ideia rodriguiana de que o Brasil é um país em que o canalha sempre teve seu espaço sagrado.

Na última leitura, fui presenteado pelo autor com uma daquelas notas mentais que de tão lúcidas, certeiras e atemporais são quase inéditas:

“Só o canalha precisa de uma ideologia que o justifique e o absolva”.

Grifei mentalmente. Era como se Nelson — o único brasileiro legítimo — Tivesse vivo e assistindo o mundo de hoje. A frase bateu nos meus olhos, timbrou no meu cérebro como um sino de igreja e fixou com caneta permanente em negrito.

Era como se Nelson tivesse, lá dos anos 60, previsto o futuro aqui agora. Sábio e vivido, ele tinha uma certeza: O canalha é o pior dos indivíduos. E nada mais comum, popular e clássico nos dias de hoje do que a figura do canalha.

Para além da esquerda e da direita

Nunca me enganei. Há idiotas por toda parte. Esta não é uma condição exclusiva dos conservadores, nem tampouco restrita aos progressistas. Ser essencialmente crápula é a única coisa democrática do discurso polarizado atual.

Acuso sem medo de cometer injustiça: O atual homem politizado idolatra o mais sujo, desonesto e vigarista modo de emburrecer.

Por mais que exista um glamour em se dizer um sujeito politizado, no fundo, isso tudo não passa de uma encenação feita por dublês. E nas suas atuações coordenadas e aclamadas pelo seu próprio métier, fingem uma intelectualidade sofisticada que nada mais é que balbuciar bobagens em papos políticos de bares.

O canalha não se importa com a realidade. Ele pratica os seus recortes de fatos, simula situações favoráveis ao que pensa, edita descaradamente os pontos e dá a luz a sua mais completa convicção sequestrada. O canalha é um ótimo fingidor.

É justamente o canalha partidário que vicia-se a olhar apenas para um lado, que cooptam pessoas com argumentos falsos, que manipula mentes para provar um ponto, que mistifica o adversário com lendas infundáveis e que pirateia os discursos mais comuns.

Os assuntos relacionados ao mundo da política tem se tornado o lugar em que menos se encontra a inteligência. Isso porque temos o cenário em que o burro é o voluntariamente burro. O resultado disso é que estamos sofrendo um atentado à construção da inteligência.

Há sim terroristas intelectuais por toda faúna partidária

Em todas as matrizes políticas, temos que lidar com sujeitos comprometidos até as tampas com sua retaguarda aliada. E para preservar toda uma entidade, acabam por forjar a lógica, por toparem passar vergonhas públicas, por burlar as obviedades, enganar-se a si mesmo e falsear seus óculos para fingir um contexto que não se justifica.

São pessoas que colocam suas paixões a frente da sua obrigação com a realidade — sobretudo minha classe de jornalistas — que escolheram fraudar o incontestável para imitar um mundo que nunca existiu, procuram lesar profundamente seus oponentes com truques sujos de reputação e até assumir o ponto de simular emoções e inflamar sentimentos por esporte.

Os canalhas estão sempre preocupados em trampolinar com a desgraça alheia, em protagonizar o seu inimigo nos discursos públicos e usurpar os espaços de debate para lançar ostensivas mentiras que favoreçam um discurso pessoal.

E a mentira não tem lado. Pelo menos, não no ambiente político. Não há santos e demônios afiliados às esquerdas ou a direita. Há gente desonesta por toda parte. A esquerda mente enquanto a direita falsifica e vice e versa.

Basta checar que a militânica tem ocupado espaços que antes pertencia apenas a ladrões, falsificadores e enganadores. Chegamos ao evidente contexto em que tudo é sobre narrar e nada sobre o que restritamente se é. Quem tem mais braço de narrar ganha a versão mais impactante da história.

O fenômeno da bolha

Todo canalha só consegue viver com outros igualmente canalhas. Repare bem como em absolutamente todas as suas relações consideradas saudáveis, diante das rodas sociais que frequenta, ele procura sempre frequentar lugares em que sua radicalidade se cria.

Basta observar que o canalha apenas sente-se confortável nos locais que pode dizer sua meia dúzias de opiniões favoritas e ser aplaudido pelo seu grupo. Discursa suas palestras ideológicas misturada com a arrogância visível e a sua inocência inexperiente, e acaba por expor sua nudez intelectiva, sua radicalidade fruto da insegurança e seu perfil essencialmente bélico para esconder uma intenção particular.

Mas, no fim, é tudo bafo de boca. Toda aquela profunda rigidez do discurso inflamado, desaparece quando o convoca para morrer pelo que acredita.

Basta retirá-lo o canalha do seu bando para que se transforme num sereno negociador de diplomacias.

É por isso, que toda a fala do canalha é para recrutar. Repare bem, independente do teor do discurso, há sempre alguém tentando te convencer de que seu lado político é o melhor para pertencer. Ninguém quer sofrer sozinho.

Como identificar e desviar-se de um canalha

O canalha político é mais que um termo. É o reflexo de uma falta de caráter. É nada mais que a quintessência da figura patética que estamos nos tornando. Primeiro passo para evitar um canalha é saber reconhece-lo. (E, às vezes, fazer isso na frente do espelho).

O canalha é um de trás das cortinas e outro diante da plateia. Ele se esconde na educação ou erudição, mas perde as estribeiras diante de uma acusação. Sorri diante dos holofotes, mas se torna o pivô das confusões cotidiana, faz questão de afastar-se da corrupção, mesmo que seja peça fundamental para a falcatrua ornamental da desonestidade.

Desviar de um canalha, ou de se tornar um canalha é um trabalho minucioso. Temos que observar bem para que não caiamos nessa.

Basta reconhecer que de todas as paixões de um canalha, três principais se destacam: O discurso da razão plena, o domínio sobre a narrativa e o poder sobre o outro.

Não se enganem, para ser um canalha de marca maior não basta ser escroto, tem que carregar por onde anda aquele ar ufanoso de inatingido, tem que colecionar o altivo modo de não dar o braço a torcer.

Para o canalha, a aparência de superior é seu maior patrimônio. Carrega consigo a plena convicção de que que detém o único discurso correto no mundo.

Nelson estava mais que certo: Só o canalha precisa de uma ideologia que o justifique e o absolva.

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O que não te contam sobre a paranoia de uma nova dor

Nada incomoda mais a gente que o surgimento de uma dorzinha esquisita. Na medicina, o inédito e exclusivo é uma anátema. O problema não é a dor em si, mas a paranoia que vem com ela.

Todo mundo tem aquela pequena cisma, que crescentemente, cria agonias inexplicáveis. Inaugura desconfortos inevitáveis e rega um descortês e hostil sofrimento à prazo.

O local da dor está ligado diretamente ao nível da nossa preocupação. Acordar com um incômodo no peito, me fez delirar em inimagináveis pensamentos de finitude. O maldito incômodo era silencioso. Não palpitava. Não latejava. Apenas estava ali, como uma barata no banheiro ainda não descoberta.

A novata dor, vinda de um lugar desconhecido, te rouba a paz. Um furto profissional. E como qualquer recém-chegada obsessão, não conseguimos empilhar num canto. Não dá para fazer como as roupas sujas na escrivaninha. A gente tem que encarar.

A dor nem é tão grande até a gente pesquisar. Peraí, pesquisar não, investigar. O CSI do padecimento renasce. Ouvimos os passos do nosso Sherlock interno. Farejamos suspeitos mais prováveis - e quase sempre é a cerveja e o torresmo de quarta - mas, nunca, nunca descartamos as dubitáveis razões. A dor vindoura se torna como um assassino sempre a espreita que precisa ser descoberto o mais rápido possível.

Depois de certa idade, as velhas dores já tiveram tempo de se entenderem bem e protagonizarem seus sincronismos. São como comadres cordiais com hora marcada para o chá semanal. Nas suas manias se entendem umas com as outras. E a dor nova, luta por um espaço e atenção dentro da sua rebeldia juvenil.

Confessar uma dor é assumir o ateísmo fraternal. Seus amigos sempre desconfiam. Confidenciar um pecado fármaco é, na verdade, ser totalmente incompreendido. Ninguém é capaz de sentir a sua dor, mas todo mundo te recomenda curas. 

Um hipocondríaco é como aquele sniper isolado sempre à espreita de uma ameaça. Um kamikaze que encontrar na leitura da bula o seu próprio manual de guerrilha. Ele é um terrorista reconhecido que rouba para si todos os sintomas, e num vício incessante, diariamente, rapta uma nova dor e a cria em seu próprio cativeiro.

Basta amanhecer com uma nova dor e retiramos das gavetas os mais diversos especialistas de todas as áreas. E não é fácil encontrar bons médicos ouvintes. Eles vão logo tomando o atalho de, cirurgicamente, arrancar uma boa e consistente paranoia.

Na época que estamos acaba sendo sempre algo de fundo emocional. Eles mandam a gente tomar mais água, praticar atividades físicas, meditar depois do almoço e trabalhar menos. E se a gente insiste, tentando lembrar de um parente que morreu de repente - de problemas cardíacos, diabetes, bebedeira ou qualquer outra tragédia - o médico denuncia a nossa miragem mental.

Insisto. Tento explicar para o doutor que o que dói é o medo de doer, mas eles resolvem sempre dosar um pouco de bom senso para anular a medicina popular de ponta. Aguardo o dia em que as mandingas de mães e as de avós ganharão o prêmio Nobel de ciências. Os médicos terão que aplaudir as senhoras de portão. Vai ser o melhor dia da minha vida.

Volto ao cardiologista com o maior cinismo do mundo. Fingindo que a dor que tenho não é nada demais. “Cuidar muito da saúde, é doença”, lembrou-me um neurônio desse aforisma. Por um instante, abandonei a obsessão pela nova dor. Assumi que meu coração estão bem. Afinal, quem procura sempre acha. O diagnóstico? Paranoia! A mais absoluta loucura dos nossos tempos.

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O que não te contam sobre viver de escrever

Escrever é uma atividade involuntariamente solitária. Sua pousada constante é o isolamento do seu auto exílio emocional regado por um deserto de pessoas.

Um soco na primeira linha e já uma lição, caro leitor: É justamente da insociabilidade que vivem os escritores, das verdades mais impopulares e da sua mais covarde coragem de olhar para si, para o outro e para o mundo sem a misericórdia da inexatidão.

Quem insiste em permanecer na convivência de um escritor, encontra nas bandas de cá, outros tantos escritores, igualmente lunáticos e viciados em suas próprias neuroses de caligrafia num abecedário tão incomum aos olhos comuns. Aqui, tem um mundo a parte.

A vida da escrita leva o autor a agarrar-se no delírio insuportável e insistente de compor frases cheias de palavras calculadas. Uma chave necessária para tentar esvaziar a sua maior fraqueza: O desperdício da sua vaidade incontrolável.

A natureza do escritor

Os escritores pertencem a uma restrita fauna ilusória. Estão cada vez mais extintos por uma crueldade imbatível: A dolorosa obrigação de manter longe do seu habitat criativo devido a sua falta de condições de sobrevivência. É como aquele animal que, sendo um carnívoro voraz, aprendeu a contentar-se com ervas doces do campo na sua dieta diária.

Vive uma corrida constante contra o drama do papel em branco, e toda vez que diante dele está, mendiga uma ideia simples que seja espremendo a consciência para produzir qualquer coisa razoável. O seu ringue principal é encher laudas como quem enche os pulmões depois de um mergulho profundo.

Para todos que vivem de redigir, não existe angustia maior que o resultado pífio das objetividades e dos clichês. Há muita indecisão em produzir discursos e ordenar informações, e por vezes, esbarram na visita indesejada de um bloqueio aparentemente intransponível.

Só um susto imprevisível na gestação inesperada de ideias é capaz de partejar uma esperança alfabética. Dos sutis socos nos teclados, uma ideia absurda força os dedos a debaterem-se numa vertiginosa marcha rumo a fuga estonteante de uma entrega ponderável.

A poesia, o conto, o romance, a crônicas tornam-se tiranas ainda no berço, como os garotos fazendo birras diante dos pais frouxos nos corredores dos mercados.

O público como obrigatoriedade criativa

Do outro lado dos escritores, agora, para as bandas de lá, existe o mais violento e faminto público. Para eles, o escritor é apenas o mais nobre preenchimento da sua incapacidade de expressar e dizer o que pensam.

O autor é, para seu público, a cápsula homeopática de coragem diária. Sem eles, seus olhos ficam fracos, seu corpo esgotado e seus músculos quebradiços. São eles que, com seus bocejos ou aplausos, nos amaldiçoam ou nos levam ao céu, nos adornam com elogios rasos ou nos esmagam entre os dedos brandos dos seu deslike.

É pensando neles, que o escravo das letras, amarrota suas bobagens e as empilham numa lixeira intolerante. É olhando para a plateia que hesitamos diante de fraseado agressivo, mudamos o sentido do verbo, escondemos a malícia proposital, fingimos o insulto inocente e buscamos proteger a intenção incolor por trás do que dizemos.

O inconfundível legado da obra

É porque somos escritores, que temos o cuidado de trabalhar com o frágil transpor de ideias. Basta uns parênteses com a má-criação de um menino de rua, umas aspas mais bem posicionadas que um infante atirador de elite, uma visita indelicada ao inseguro mundo da imaginação e cai por terra toda a diligente tentativa de credibilidade.

O que não te contam sobre viver de escrever é que todo o bem mora no vilarejo de uma folha em branco, mas é a mais valorosa e apócrifa das profissões. Ninguém fala que viver de escrita é sobreviver a cada dia.

O que sobra do autor são somente os seus mais distintos pensamentos que na sua imortalidade resistem ao tempo. A escrita traz imortalidade ou deixa a estupidez eternizada.

A escrita é a mais importante das armas de guerra. E o escritor é o soldado na linha de frente de todas as ideias do mundo. Ao mesmo tempo em que ajuda a vencer, está um pouquinho mais perto de morrer num acaso impensado.

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O que não te dizem sobre a complexidade do outro

Na mesa dos cafés começam muitas coisas importantes, mas também muitas injustiças. Entre os goles, há sempre um sujeito a ser malhado. E todo mundo tem o seu próprio Judas de estimação.

Cheguei mais cedo do que o combinado. Escolho a mesa mais perto da porta por puro capricho, peço o meu já tradicional suco de laranja sem açúcar ratificando a formalidade do meu estômago que anda recusando cafeína como um cão enjoado de biscoito.

Dispenso o líquido preto, mas nunca recuso um pão de queijo acompanhado de uma boa conversa em volta da mesa. Chamo de boa conversa apenas aqueles papos que saímos de lá com a impressão de que ganhamos uma biblioteca nova para explorar. Pois bem, esta era a cena ordinária em questão.

Chega um velho amigo de longa, dobra o guarda-chuva todo atrapalhado, me cumprimenta com a informalidade de uma amizade sólida, queixa-se da falta de estacionamento, toma sua posição na cadeira em frente a minha e reclama do lugar que escolhi como de praxe. Apenas sorrio da sua inconfundível azedume cômico. Ele pede o seu café forte e rígido, sem ornamentos carnavalescos.

Não demora muito para começar as arbitrariedades. Antes que eu molhasse o bico, ele começa o papo criticando os comportamentos indecorosos de uma outra pessoa em comum que frequenta nosso círculo de amigos — todo mundo tem um amigo daqueles que só a gente mesmo aguenta. Vai logo me questionando como é que ainda mantemos o tal fulano na amizade.

A indignação era tanta que, descrevia-o como um diabo de rabo e tudo mais, concluindo: 

 — Olha só, cara, eu acho que ele precisava era realmente se dar um pouco mal na vida para aprender a ser diferente com as pessoas. Eu acho que ele tinha mesmo que passar uns apuros graves para aprender a ser menos filho da puta.

Pacientemente, esbocei um sorriso incólume, e disparei:

 — Olha, somos amigos dele certo?

Esperei a resposta verbal que por teimosia não veio. No lugar, uma expressão de dúvida e incerteza no rosto talvez almejando onde é que eu queria chegar com aquilo. Prossegui cuidadosamente:

 —  Então, acho que como amigos dele, precisamos entender que: se ele age, fala, pensa, faz e vive de um jeito complicado é porque ele tem uma história. Você conhece a história dele?

A minha pausa proposital agora exigia uma resposta verbal.

 — Sei um pouco, mas não tudo..

 — Tá bem, vou te contar algumas delas…

Aproveitei que ele já tinha me dado toda a atenção dele para contar algumas coisas realmente problemáticas na vida dessa terceira pessoa que, não justificava, mas explicava algumas coisas denunciava a sua postura rude diante da vida. 

Ele me confessou que não fazia ideia daquilo tudo. Via o espanto e o arrependimento dele flagrante.

As pessoas são complexas por motivo de: Elas são pessoas

Não temos como saber ao certo o que está passando na cabeça das outras pessoas. E mesmo que você conviva já há algum tempo com elas, em um dado momento, acaba por descobrir que não a conhecia tanto como imaginava. 

Não só porque as pessoas são complexas, mas porque elas seguem mudando. É por isso que, naturalmente, acabamos analisando pessoas sem levar em conta aquilo que elas viveram. Não podemos nos acostumar a imaginar que alguém simplesmente é cruel por esporte — embora exista sim essa dimensão.

Outro dia uma amiga teve que ouvir o chefe justificar suas atitudes grosseiras com a frase: “Eu fui forjado na dor”. Quando ela me contou, recomendei que ela respondesse: “Mas, meu anjo, essa é sua história. Você tem que dar conta de aprender a lidar com ela. Não deposite nos outros os seus encargos emocionais.”

Quando nem a gente mesmo aprende a olhar para nossa história e encontrar os buracos que nos transformam e nos direcionam em todos os sentidos da vida, atuamos em uma superfície áspera completamente desnecessária. O amargor da vida traz para nossa rotina apenas mais um elemento estressante.

 A complexidade do outro é a nossa própria, mas com detalhes diferentes

Nosso cérebro pode até comprar a ideia de que se a gente se comporta de uma determinada maneira, estaremos sempre condenados a repetir esse padrão, e essa mentalidade facilmente reforça comportamentos viciado e acaba se fixando hábitos ruins. 

Esse é ao mesmo tempo um labirinto sem saída no qual permanecemos perdidos, mas pode se tornar um esconderijo sentimental diante da covardia da mudança de mente. 

Talvez seja essa ideia de traços de personalidade imutáveis que reforça o corpo emocional. Isso explica a origem da violência, por exemplo. 

É justamente essa ideia que justifica, sermos rudes com pessoas, xingarmos desconhecidos no trânsito, sermos mal educados com pessoas que só estão fazendo seus trabalhos e ignorar pontos de vistas importantes mas distintos do nosso que acabam cruzando com a sensibilidade do outro de maneira bélica. 

Todo mundo, no fundo, é bem mais complicado do que acha que é

Ter uma simples empatia intencional de imaginar-se no cenário do outro, pode desenvolver na gente muito mais compreensão e identificação com aquilo que as pessoas estão vivendo.

Fazer o esforço mental para tentar entender o momento em que pessoas estão tem que ser um exercício recorrente. Buscar capturar elementos da história de pessoas nas entrelinhas das suas ações não só nos ajuda a ser mais compassivos como elas, como também desenvolve na gente uma noção empática das realidades distintas. 

O que não te contam sobre a complexidade do outro é que entender e se fazer entendido nessa guerra de lados diversos, pode resultar em uma aderência maior à compreensão de que a coletividade e a flexibilidade são uma obrigação fundamental na convivência. 

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O que não te contam sobre a importância de ter gente por perto

Eu já disse aqui categoricamente que estamos todos fudidos da mente. Acho que ninguém consegue fugir dessa evidente constatação. Encontrar pessoas que estão totalmente presas as dificuldades emocionais é bastante comum a cada dia que passa.

E mais. Sei bem do tamanho do problema que compro aqui advogando sobre a necessidade essencial do outro em um mundo cada vez mais decepcionado com pessoas e apático a ideia de “precisar de pessoas com parte da felicidade”.

Calma, vamos por partes. Estou completamente convencido de que a ideia exagerada de priorizar sempre uma autonomia sentimental em relação a entregar-se ao outro não nos tornou independente como queríamos, mas nos fez ficar mais indiferente frente as pessoas, sacrificando no altar do egoísmo uma uma vida amorosa compartilhada.

As pessoas têm todo direito de ficarem desacreditadas das relações. Provavelmente, seu espelho até mostre uma dessas pessoas, mas não fique com vergonha do flagrante, muita gente está nessa condição. Eu mesmo sofro de constantes inseguranças sobre o outro.

A questão é que no meio dessa bagunça toda chamada vida, temos de recordar que a gente vai encontrando também pessoas que nos ajudam diante da realidade de empatia, de compreensão e de carinho mútuo.

Do outro lado, ficam as pessoas que chegam para botar fogo no nosso circo emocional sem o menor pudor e cuidado. Essas pessoas não deveriam ser aquelas que fixamos como referências. Nivelar as relações humanas por baixo é um vicio. É como manter-se voluntariamente míope por não querer ler as frases de um livro.

Sem mais rodeios. O convite reflexivo é simples: Será que podemos viver sozinhos com tranquilidade e satisfação ou compartilhar as nossas mazelas com os demais pode ser uma realidade saudável e possível?

Você está num cativeiro mental

O nosso cérebro é dividido em diversas partes e unidas provocam todas as sensações, emoções e sentimentos. Não quero te explicar nada técnico porque eu mesmo não tenho essa capacidade, mas preciso que você saiba que está refém da sua maneira de sentir, perceber e encarar a vida.

De alguma maneira, estamos sempre diante de pensamentos emocionais aleatórios que são construídos basicamente porque acostumamos a olhar somente para o que está acontecendo de ruim ao seu redor. 

A sua condição mental pode o enganar. Ela pode dizer que alguém está afim de você apenas porque recebeu um sorriso, pode lhe dizer que está com fome só porque sentiu um cheiro de algo apetitoso, pode sugerir que alguém o traiu só porque viu uma foto. Estes são alguns casos em que somos sequestrados da realidade. A prisão mental confisca a lógica para criar um mundo inexistente.

Quando tenho percebido que talvez eu tenha levado meus pensamentos muito a sério, faço o exercício de anotar as minhas paranoias e uma a uma vou visitando-as e analisando se existe algum dos pontos que tenha um mérito lógico.

Procuro nas minhas teses algum sentido racional, reparo bem nas emoções envolvidas dando nome a elas, e não demora muito para eu perceber que a maioria dos meus pensamentos são coisas criadas pelo imaginário, portanto, limitados a uma logicidade aleatória que é quase nunca baseada em fatos concretos.

A vida compartilhada nos ajuda a sair de si

Escolher quem será a tripulação que vai nos acompanhar na longa viagem da vida é sem dúvida uma das escolhas mais importantes. Não podemos obrigar pessoas a sempre irem ao nosso próprio lugar de escuridão, mas temos que dar espaço para elas visitarem a nossa solidão às vezes e nos ajudar a faxinar os excessos que existem por lá.

Precisamos retirar da nossa mente a percepção de que todas as pessoas ao nosso redor são ruins e querem nos prejudicar. Essa mentalidade não nos permite viver ao lado de ninguém. É mais que necessário perceber se nossa mente nos empurra naturalmente para teorias céticas ou se nos ajuda a sermos confiantes no que diz respeito ao relacionamento com as pessoas.

Uma análise mais cuidadosa de como estamos lidando com essa percepção das pessoas ao nosso redor nos permitirá descobrir facilmente quem está levantando e quem está nos derrubando.

A partir daí, nesse sentido, precisaremos criar um esforço autêntico e progressivo para desviar das pessoas que nos prejudicam e ter o mesmo vigor para ficar ao lado das pessoas que nos potencializam.

Ainda existe gente de verdade por aí

O que não te contam sobre a importância de ter gente por perto é que existe uma dimensão de sucesso em viver com o outro que pode se transformar em um produto saudável para a mente, que pode gerar companheirismo real, e que mesmo diante de um mundo completamente solitário, é possível achar pessoas na caminhada que são doadores de energia, que inspiram os outros, que cuidam da gente mais do que até a gente acredita que merece.

Existe gente de verdade no mundo e que nos ajuda na tarefa de ser parte dos nossos sonhos, gente que acalma nossa mente, mas para que possamos viver isso, temos que dar um passo em direção do outro antes mesmo de querer algo em troca.

No caminho da vida vamos achar pessoas que tem a função de nos acompanhar no sofrimento, mas fazer isso da maneira mais respeitosa e dócil possível, não imputando sobre a gente as neuroses e culpas, mas nos livrando das coisas que nos afligem diariamente. Ter gente perto da gente nos livra da condição de viver apenas para o próprio umbigo.

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O que não tem contam sobre prioridade não ter plural

A minha vida em aeroportos me trouxe muita aventura. Normalmente, quando encontro alguma personalidade famosa eu apenas o deixo ir em paz. Não faço o tipo tiete. Manter-se na sua insignificância pode ser saudável. 

Acontece que, numa dessas filas de espera de embarque, tive a oportunidade de estar atrás de um homem que admirava muito. Meu respeito por ele não é somente por vê-lo como uma referência no estilo de vida que levava — Sim, ele já faleceu — mas por ele ter sido reconhecidamente um homem muito próspero em algumas áreas da vida e conhecido por ter uma sabedoria inestimável que o levou ao sucesso em tudo que fazia.

Quebrei o meu protocolo. Eu tinha alguns minutos para tentar arrancar o melhor aprendizado das diversas experiências que ele tinha. Era uma oportunidade única. Botei-me a pensar em como aprender um pouco com ele. 

Tinha a chance de escolher uma ou duas perguntas para lhe fazer. Virei-me quase que completamente, quebrei o gelo com um comentário genérico e, em dada altura da conversa, questionei: 

 — Admiro demais você. Permita-me perguntar: A que o senhor atribui seu conhecido sucesso?

Ele virou os olhos para mim com pena da minha juventude evidente, colocou a mão nos meus ombros e como se quisesse que eu nunca mais esquecesse, me disse enfaticamente: 

 —  Prioridade.

E quando eu já ia questioná-lo, adiantou-se:

 — Aprendi nessa vida, que de tudo que faço, penso, vivo…. que de todas as pessoas que conheço, converso e convivo, de todos os lugares que morei e estive visitando, de todas as situações que presenciei, e de todo o tempo que tive na vida, apenas 2% são realmente importantes. Os outros 98% são tão desimportantes e irrelevantes ou não necessitam de prioridade.

Fez uma pausa proposital para ter certeza que eu prestava a atenção e continuou: 

— Então, garoto, durante toda minha vida eu tentei focar justamente nos 2%. Os 2% das tarefas importantes, os 2% das pessoas importantes, os 2% dos pensamentos importantes, os 2% do tempo que realmente me deram significado a tudo isso que é a vida.

Como uma vaca ruminante, meu cérebro ficou maturando essas palavras durante dias. Naquele vôo, comecei a perceber que realmente aquelas palavras tinham um tanto razoável de sabedoria.

Um papo sério sobre prioridade

Toda vez que penso que estamos diante de um mundo cheio de tarefas, eu me lembro que a vida não é sobre sobrar tempo para realizar as coisas, mas sim sobre escolher o que vamos fazer.

A nossa desculpa de estimação para o não-cumprimento de um objetivo é qualquer variante de: “Eu simplesmente não tenho tempo para isso”. É por isso que nunca começamos a academia, é por isso que negligenciamos os caprichos da dedicação em um relacionamento, é por isso que disfarçadamente escondemos os insucessos debaixo do tapete das ocupações.

A ideia da escassez do tempo pode até ser verdadeira, mas também existe algo incontestável que precisa ser considerado. A ideia de ser uma pessoa bem-sucedidas está mais ligada ao gerenciamento das prioridades do que da abundância de tempo. Nunca foi sobre o tempo, mas sobre prioridade.

Por outro lado, existe a dimensão em que nem todos os objetivos são realmente importantes. Alguns nem sequer são necessários para uma vida melhor, mas a gente deixou de entender assim. Separar um do outro é que nos confunde e nos faz entrar na mentalidade automatizada sobre o tempo. Desde organizar seu quarto até aprender um novo idioma, ambos tem a ver com o tempo e com as escolhas.

Um conselho que vos deixo

Tenho aprendido, mesmo na pouca idade, a esquematizar um sistema de prioridade que faça algum sentido. É claro que sistematizar rotinas podem sim ter uma complexidade imprevisível em um simples texto de blog, mas mesmo assim, aqui vão algumas provocações.

Pensar sobre o que está no topo da nossa prioridade é fundamental. No meu caso, procuro deixar aquilo que dá condição de energizar-me — não no sentido místico, mas no físico e mental — , ou seja, é toda e qualquer realidade que me dá condição de me sentir bem.

(Parênteses obrigatório. É preciso ponderar que quando digo “sentir-se bem” não me refiro a aquele sentimento de satisfação contínuo a qualquer custo que adoramos idolatrar nos tempo atuais, mas sim naquele sentimento que nos faz ter a percepção de que as coisas estão em ordem.)

Sei reconhecer hoje que realmente preciso focar como preferência na minha vida aquelas coisas que me dão a sensação de alívio existencial e vitalidade. Ou seja, coisas que estão ligadas à saúde da nossa mente, aquilo que tem a capacidade de tocar em nossas almas com delicadeza e que nos faz capazes de recarregar as baterias diante da jornada que é a vida moderna.

Desde um simples exercícios de meditação convencional até um longo cochilo na hora do almoço, se é para me ajudar a construir uma fortaleza produtiva no futuro, é isso que precisamos fazer nossa prioridade. Apenas coloco em primeiro lugar as coisas que me fazem sentir vivo, porque essas são as coisas que realmente devem importar.

Isso não quer dizer ignorar tarefas

Eu sei o que está pensando: “Mas nem tudo na vida é apenas sobre energizar-se.” E você tem razão. Mas perceba como podemos desenvolver uma maturidade básica de prioridade que nos ajuda em diversas situações.

Quando estamos diante de uma tarefa inadiável, apenas devemos fazer ajustes mentais que compense a sensação de perda na sua mente posteriormente. Ir a academia, entregar uma planilha no trabalho, escrever um relatório no final de semana. Isso tudo, por vezes, pode ser inevitável, mas aprenda a recompensar-se.

Quando estou nessa situação, realizo estas tarefas como quem está fazendo algo para conquistar uma nova coisa. Vale rever sem medo a nossa relação com as coisas que priorizamos. Se limparmos a casa, teremos a recompensa de um ambiente limpo. O ideal é pensar na recompensa e não no esforço.

Nesse sentido, estamos num mundo onde o trabalho é o maior de todos os deuses. Isso porque não conseguimos mais pensar no ofício distinto da ideia de dinheiro e remuneração. O trabalho não pode ser prioridade em um lugar onde a saúde mental não está no lugar devido.

Eu realmente já me vi em situações onde meu trabalho ocupava quase todas as minhas horas vagas e isso me fez criar a sensação de que a minha utilidade estava na minha capacidade produtiva. Até que ouvi uma pessoa, certa vez dizer: “Se você tem algo que não pode abrir mão, não é você que tem algo é essa coisa que o tem.”

Prioridade é mais que organização

Acho que aprender a priorizar não é só organizar-se mas é respeitar também a si mesmo. Não vivemos no mundo ideal, mas também não precisamos viver em um que não nos deixa viver. Não existe mundo mágico, mas existe um mundo possívelmente saudável.

O que não te contam sobre prioridade é que não existe nenhuma possibilidade de ter mais de uma coisa como prioridade, as pessoas que fazem os trabalhos mais valiosos no mundo sabem bem em que focar e por isso estão no caminho do sucesso.

Precisamos entender que o tempo é um conceito intangível, e, se não aprendermos valorizar aquilo que realmente importa, fazendo mudanças necessárias e progressivas tentativas intencionais de reorganizar a ideia de prioridade em nossa vida, poderemos estar vivendo uma vida ocupada, mas nada produtiva e significativa.

E se clicou nesse texto só pelo título, sei que não é isso que quer. Faça um esforço sincero e legítimo para encontre sua prioridade. Sem plural. Apenas como o objetivo mais importante da sua vida.

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Pior do que aquilo que te mata é o que te faz querer morrer

Uma vida inteira não vivida é pior do que morrer. Esta sempre foi uma das coisas que o ser humano mais tem medo: Uma existência sem significado. A coisa se agravou mais ainda desde que ganhamos a nossa capacidade de pensar e organizar ideias.

Tomamos a consciência da nossa finitude e ganhamos o vício de pensar a que viemos neste mundo. A morte seria, portanto, um elemento didático, e por sua vez, teria o compromisso professoral de nos ensinar sobre viver.

Sim, o fim da vida fala mais sobre como manter-se vivo com qualidade do que a gente imagina. Para quem está vivo, a morte é apenas a lembrança constante da irreverente importância da vida.

Ao percebemos que não temos força contra o fim, passamos a construir questionamentos sobre a razão pela qual a vida tem que fazer algum sentido. É, a vida tem que obrigatoriamente fazer algum sentido.

Esta dimensão nos foi dada como um presente que não se recusa. Pensar sobre como estamos vivendo, nos dá uma vantagem sobre toda existência.

Pode ate parecer um pouco sombrio falar sobre o fim de tudo, mas, na realidade, ponderar sobre a vida é trazer uma pouco de sobriedade para nossa embriagada autopercepção existencial.

O dever de pensar sobre o que é o sentido da vida

Há uma certa elegância filosófica em interpelar a razão da vida, mas a verdade é que não há absolutamente nenhuma resposta totalmente assertiva e que compreenda todo o perímetro da vida de alguém.

Sendo assim, gosto de pensar, não em “um sentido para vida”, mas em sentidos. Sim, no plural. A ideia da vida como o cumprimento de uma missão é mais que romântica, é patética. Os significados da vida podem ser encontrados, inclusive, durante a sua recorrência progressiva.

Alguém pode simplesmente sentir-se totalmente realizado apenas com um desejo feito enquanto outro pode essencialmente ter as mesmas escolhas e não sentir-se satisfeito.

Os sentidos da vida são, portanto, não só plural, mas exclusivamente pessoais. Mais do que isso. Se o caro leitor me permite fincar exageros nestas linhas, os sentidos da vida são intransferíveis. Assim sendo, trazem consigo uma responsabilidade de ser encontrado apenas e tão somente por aquele indivíduo que os porta.

Posto tudo isso bem na sua frente, fica evidente que encontrar os sentidos da vida pode lhe causar uma sensação estranha e até mesmo inocente de que não enxergamos com clareza.

A explicação mais óbvia para isso é que nos acostumam a não ter coragem de partir rumo a nossa essência mais interna. Nos convencemos da enganosa superficialidade.

Estamos presos nas aparências, nas falsas ideias de si, e no desconhecimento das próprios motivações, nas invasivas percepções alheias e, por isso, trancados num desenho pré-moldado de respostas para a questão da razão pela qual estamos aqui. Desistimos das respostas antes mesmo de nos perguntar tudo.

Pensar sobre os sentidos da vida é começar a dizer a si mesmo, primeiramente, que isso tudo não é à toa, e depois, criar sistematicamente uma série de reações proporcionais as variações de senso de infelicidade.

Mas, veja bem, a tristeza é sim um elemento importante que vai nos ajudar a alinhar-se com o sentido a vida, mas a infelicidade estrutural te afastará mais ainda do motivo pra viver. Não há sentido sem dor. Simples: não há dor sem sentimento.

Os sentidos compartilhados da vida

Há muita gente reclamando da vida. E há muito do que reclamar. No entanto, quando vamos investigar a fundo o que parece ser o elemento que faz com que as pessoas andem na direção da lamúria, encontramos diversos pontos.

Precisamos nos sentir parte de algo. Por natureza, criaturas isoladas parecem ter uma predisposição maior à fraqueza. Vulnerabilidade é nosso medo.

O nosso leitor sensitivo de felicidade, especialmente na era em que vivemos, se localiza na mais abrangente experiência de compartilhar.

Isso fica evidente quando estamos vivenciando algo que podemos dividir com outro. Em alguns episódios da vida, é essencial estar conectado com pessoas, grupos, ideias e sentimentos. O discurso da autonomia individual – um mito idolatrado pela mente pós moderna - é a febre que aponta para uma sociedade tentando ter um sentido completo apenas a partir de si.

Um leitor mais atento me lembrará do mencionado caráter intransferível que pontuei acima. Pois é justamente o encontrar-se que está o encontrar também o outro.

O caráter compartilhado dos sentidos da vida não exclui a individualidade, mas sim, completam-se em forças. Um motorista não deixa de fazer uma viagem quando está sozinho, mas quando tem uma carona, ela se torna mais interessante. A metáfora conclui.

Os muros modernos contra uma vida com sentidos

O que te arranca o desejo pela vida talvez não seja apenas um sentimento ruim, um episódio infeliz da sua vida, ou uma inconclusão sobre trechos da vida. São umas séries de coisas.

Há muitas fortalezas de pensamento que se configuram em sistemas emocionais, psicológicos, sensoriais e internos que nos empurram excessivamente para um local que perdemos a conexão com a vivência integral e nos atrapalha a ver o impacto da nossa vida num mundo gigantesco.

A incapacidade de sentir-se útil diante do mundo pode ser facilmente neutralizada com um esforço realmente impulsivo de ajudar pessoas nas suas mais diversas tarefas. Isso não só pode nos ajudar na descoberta das nossas próprias vocações como pode nos reconecta aos nossos interesses mais genuínos pela vida. Ganhar a dimensão do serviço nos coloca diante da vida com um senso de finalidade.

Há também uma grande supervalorização das emoções e uma ênfase exagerada na abundância de sentimentos positivos. Costumeiramente, essa realidade é tipificada na busca incansável pelas figuras da tríade: influência (na imagem de poder), no dinheiro (na imagem de status) e no amor (na imagem do sexo).

Não despreze mais alguns detalhes importantes

Uma outra barreira é o constante medo de se aproximar dos outros que gera uma desvalorização nas relações e nos laços mais fundamentais.

Temos a sensação de que somos e estamos o tempo todo sozinhos no mundo e que não há realmente nenhuma realidade concreta sobre o conviver, aprofundar e entregar-se a um amor genuíno.

A falta de uma comunicação mais proveitosa em todos os sentidos gera uma quantidade enorme de desconfianças contínuas a respeito da vida, do outro, dos ambientes mais próximos e do mundo como uma grandiosidade.

A ausência de introspecção resulta na mentalidade de manada e na extinção da busca pelos próprios talentos autênticos. Pensamos ser imprestáveis.

Em um mundo que há preocupação exagerada com o dinheiro, ser útil quer dizer ser lucrativo, e isso, significa não ter tempo para educação emocional, para desenvolver habilidades sociais saudáveis frente às comunidades.

Nos tornamos um tipo mais honesto de sobreviventes de um desastre que nos tornou apenas uma vaga existência cumprindo as demandas urgentes da vida.

Para que possa reaproximar dos sentidos da vida, temos que aprender a honestamente avaliar cada ponto e criar um plano de contingência capaz de nos alavancar para fora do modelo convencional de vida medíocre.

Ou é isso ou aceitamos experimentar a tragédia da morte ainda vivos. E nada mudará nunca. O que te mata não é só um coração parado, mas um coração sem combustível.

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O que não te contam sobre prestar atenção nas pessoas, lugares e coisas

Corriqueiramente, me dizem: “Você olha bem nos olhos da gente quando está conversando, né?”. E toda vez, tenho que explicar que aprendi isso com um velho amigo.

Apesar da idade já avançada e da sua super sabedoria adquirida, ele deixava todos que conversavam com ele com a impressão de que aquilo que diziam era a coisa mais importante do mundo. 

Até hoje, carrega consigo sempre um olhar de quem presta atenção em cada palavra que dizem a ele. Vai ver é por isso que é uma das pessoas mais inteligentes que conheço.

Antes mesmo do ofício de jornalista, me consideravam um atencioso ouvinte. A vida dedicada à escrita nos presenteia com o dom de observar tudo e todos a nosso redor. A capacidade de ler realidades, extrair lucidez, pontuar didaticamente a vida e perceber detalhes com clareza é um triunfo para quem trabalha com a escrita.

Claro que isso não pode ser encarado como um super poder raro. Muitos de nós sofremos com este problema de viver em um mundo totalmente abarrocado de informações e suscetíveis a desenvolver a incapacidade de ficar focado adequadamente no que realmente é importante no presente.

Temos que aprender a observar a vida com cuidado 

Não importa se estamos diante do trânsito caótico, que aparentemente faz parte do cotidiano, ou se estamos em uma bela praia paradisíaca num dia lindo, temos que nos desdobrar para aprender a olhar com cautela para o que está a volta. Digo observar buscando ver realmente o presente.

Temos que aprender a manter a mente onde nosso corpo está. Um bom exercício que pratico é fazer questão de virar o celular para baixo diante de uma mesa de bar, e a razão é bem simples: Se alguém decidiu estar comigo e me ceder um pouco da sua presença, é, ao menos recíproco, inclinar-me para o que ela diz.

Você já pensou que pessoas, lugares e coisas têm uma certa peculiaridade que jamais será vivida novamente? O que torna o presente o melhor momento é que ele não pode ser editado como o passado e nem projetado como acontece com o futuro. A vida está ali. Ao vivo e a cores. E isso muda tudo.

A mente junto do seu poder criativo, involuntatiamente tendem a construir uma ponte que nos dá acesso a um universo natural de viagens temporais. No entanto, esquecemos que quem está no controle desse trajeto mental e dirigindo esta locomotiva de pensamentos somos nós mesmos.

A falta de observar o presente com detalhes nos faz escorregar na impressão que há algo de mais significativo e interessante fora dali. A nostalgia ou no porvir são criações que nos deixa esquecer do instante ocasional e nos faze perder a oportunidade de vivenciar momentos e instantes insubstituíveis.

Quando nos educamos para estar presente naquilo que os olhos veem, nos damos conta de que somos testemunhas de uma grande quantidade de possibilidades.

Não só os olhos nos tiram o foco

A reação com o ambiente em que estamos tem o poder de nos distrair do que realmente importa. Já faz algum tempo que não consigo frequentar alguns lugares que me sufocam de informação. E a razão é bastante simples: Não tenho mais interesse no que não importa.

A ilusão de que precisamos estar atentos a tudo que acontece nos deixa cansados, e por vezes, desatentos do fundamental. As paisagens que estamos inseridos têm o poder de corromper a nossa concentração. É muito mais fácil estar diante de uma obra de arte desconhecida do que de uma conversa monótona de Uber.

Estamos sendo vagarosamente submissos a uma cultura de mentes caóticas, ou seja, existem tantas coisas que passam pelo nosso cérebro, que somos incapazes de conseguimos filtrar. Esta é a razão da fadíga mental. Não é incomum vermos pessoas fingindo que ouvem as outras enquanto bisbilhotam qualquer rede social em seus dispositivos móveis.

Devolvendo a atenção no lugar certo

O que não te contam sobre a atenção é que precisamos aprender a realocar nossa atenção. Isso não quer dizer nunca mais se distrair, mas sim, criar uma disciplina para entender as razões e motivos que nos deslocam do que realmente é importante.

Precisamos estar preparados para lidar com o jeito esquisito que nos acostumamos a não nos interessar pelas pessoas, pelos lugares e pelas coisas banais da vida. Todo mundo sabe que sua atenção está localizada em ambientes fora do presente, mas aprender a observar-se é também crescer como pessoa.

Se aprendermos a reconduzir nossas atenções, talvez possamos também gozar mais da vida em momentos únicos com outras pessoas, e perceber a felicidade presente nos detalhes e, quem sabe, trazer um novo significado para tudo aquilo que somos, pensamos e vivemos. 

É somente entendendo onde está e onde deve ficar nossa atenção que podemos pertencer ao agora, sem dar lugar àquilo que já foi ou a àquiolo que ainda não é real. O lugar que está sua atenção é para onde voce pisa.

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O que não te contam sobre fazer da gentileza mais que uma modinha

Depois de uma dermatite, resolvi que ia procurar um médico. Durante a consulta com o especialista, aponto para a estante de livros e pergunto sobre uma foto que me chamou a atenção.
Por cima dos óculos, ele olha na direção, pausa a receita médica que fazia e dispara: “Você disse que é escritor, não é? Então, se prepara para uma boa história, garoto.”

Empolgado, ele me conta que participa todo ano de um programa de voluntariado com pessoas do mundo todo. Ele e outros médicos, dedicam 4 meses, geralmente em alguma região economicamente precária do planeta, a atender pessoas em condição de miserabilidade, tudo isso via uma organização mundial bem conhecida.

Entre um detalhe e outro, ia me contando deixando nítido sua postura de felicidade, o sorriso saudosista deixava claro o senso de utilidade, usava uma linguagem positiva e seus olhos brilhavam denunciando de uma maneira especial, que ele sabia o bem que fazia as pessoas quando estava lá.

Confessou-me que apesar de ter conquistado muito reconhecimento profissional, de ter conquistado uma condição financeira segura, ele esperava ansioso todo ano por aqueles meses como uma criança espera o Papai Noel no fim do ano.

Interrompi sua empolgação e conclui: “Doutor, vejo os olhos brilharem quando o senhor conta isso. Quer saber o que é isso? É a sua gentileza o levando ao cerne do que o senhor veio para fazer no mundo. Acontece que sua gentileza não é propaganda, não é fabricada, é algo que carrega consigo.”

A gentileza como parte do ser humano

A maioria das pessoas gosta de pensar em si como uma pessoa gentil. Os atos de bondade que realizamos nos ajudam a construir uma identidade positiva sobre nós mesmos. Consequentemente, nos autopercebemos como alguém generoso e isso nos faz sentir um tanto menos culpados e, automaticamente, mais orgulhosos do que descobrimos que podemos sentir, ser e fazer.

Diante de um mundo enraizado no individualismo e no narcisismo — especialmente no ambiente digital — ser gentil e exercer a empatia é visto como algo extraordinário. Não é complicado ser gentil em certas ocasiões, difícil é ter uma mentalidade de generosidade constante.

É claro que existem diversas maneiras diferentes de perceber e praticar pequenos atos de gentileza, mas em um mundo absolutamente sem empatia, qualquer ação em prol da cortesia e da delicadeza nos deixa abismados.

Temos falado muito sobre o assunto atualmente. Já foi o tempo em que a gentileza era coisa de monges budistas nas montanhas do Tibet. A polidez usual é instrumento necessário e importante na vida individual, nas relações coletivas, no mundo dos negócios e em um mundo cada vez mais plural.

A gentileza não é mais um superpoder e não deveria ser vista como atributos de um super-herói, mas tem que fazer parte de uma realidade diária e estar inserida nos meios mais convencionais da humanidade. Não pode ser um palanque para se promover, tem que ser uma alavanca de ações em prol do outro.

Quando falamos de cultura da gentileza, estamos falando de que?

Parece-me que é mais comum encontrar a ideia de ser gentil sendo praticada em ambientes em que não existem obrigações claras e que não possuem relações de compromisso e responsabilidade. É muito mais fácil ser gentil com uma criança da Africa do que com aqueles que convivemos todos os dias.

No ambiente de trabalho, por exemplo — cercado de hierarquias, fomentado por competições, ambientados com disputa, vendo o concorrente como alvo de eliminação, valorizando uma alta velocidade nos reasultado —  o assunto ainda é muito recente. 

De igual modo, nos ambientes familiares, a cultura de gentileza exerce mais um papel diplomático, do que demonstrar qualquer interesse em compreender e reconhecer fragilidades alheias. 

Apesar de parecer que a empatia esteja mais presente em ambientes de amor, é justamente o contrário que costuma acontecer. O ambiente do amor tem peculiaridades comportamentais muito mais nocivas, pois carrega consigo uma hostilidade provocada pela liberdade, pela obrigação do perdão e pela constante aproximação que o senso de comunidade traz. Dizemos as maiores e mais indelicadas atrocidades em nome de uma suposta intimidade.

É por isso que a cultura de gentileza tem a sua estreita relação com o exercício da empatia, com a prática da escuta ativa, com o esforço para o entendimento mútuo e e o reajuste de sintonia possíveis.

Ser gentil não é tão difícil quanto parece

O que não te contam sobre a gentileza é que é mais do que preparar discursos sobre se colocar no lugar do outro e forçar um ambiente artificial. Ser gentil tem que ser encarado como uma oportunidade constante. É obrigatoriamente se despir inicialmente de todo e qualquer argumento bélico, parar e se conectar com os outros.

O desafio de criar mudanças organizacionais e sociais que nos ajudem como os nossos modos de olhar a vida, os preconceitos que construímos a longo do tempo e barreiras psicológicas que nos impedem de estar ligados ao outro.

A gentileza é obviamente uma sequencias de aulas que vão resignificando pequenos trechos da vida inteira e é por isso que é a coisa mais importante que você pode fazer por você, pelos outro e pelo mundo.

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O que ninguém te conta sobre estarmos mentalmente fodidos (e não conseguirmos sair dessa)

Estamos mentalmente acabados. Você entrou no link, viu o tamanho do texto e já te deu uma preguiça, não foi? Pois é, é sobre isso que vamos falar. Me dá essa chance de te ajudar.

O lance é o seguinte: Todo mundo que converso vive uma espécie de “fadiga psíquica” que não sabe explicar a origem. Quase todas as pessoas que convivo me confessam que a vida tem sido pesada. Mas, o sofrimento é que aumentou ou a gente que ficou mais sem ânimo?

Não importa se somos mais velhos e temos um porre de experiencias acumuladas ou se estamos no verdor da inocência típica da flor da idade, a nossa cabeça está completamente confusa.

Não importa se compormos a maioria da média das pessoas ou se estamos pontualmente deslocados na nossa multiplicidade diferença, a mente está bagunçada como um quarto de um adolescente.

Não importa se cremos em diversos deuses ou em nenhum deles, se termos recursos intermináveis ao nosso dispor ou se vivemos os dias contando moedas para uma refeição, algumas coisas continuam não fazendo sentido.

Tá foda para todo mundo

O cenário se descreve. Não estamos dando conta de viver dramas e pressões que jamais imaginaram que fôssemos viver um dia. Apesar disso, as doenças mentais não estão ligadas a qualquer índice de pré-requisito mínimo. Atinge democraticamente quaisquer mentes com brutalidade.

Você pode argumentar que a angústia não é nova na prateleira de sentimentos humanos, e está certo, desde que o mundo é mundo, o sofrimento é a maior das verdades inevitáveis. No entanto, o que me refiro aqui é algo muito mais alarmante e preocupante do que as tragédias convencionais da vida.

Muita gente que convivo sente-se sem saída numa espécie de buraco das incertezas, sente-se vivendo um congelamento sentimental perigoso e um afastamento emocional que acaba por nos deixar em estado de solidão e cinismo sentimental muito próprio deste momento.

Diante dessa evidência, porque é que temos a sensação de que tudo está pior e que não temos mais escapatória para viver uma vida mais leve? Qual são as nossas crenças e contextos que nos impedem de enxergar uma luz no fim do túnel?

As pessoas, a rotina, a vida. Tudo está um saco

Agora pouco, tive uma conversa extremamente delicada e embaraçosa com uma pessoa. Ela me explicava da sua perspectiva a respeito de um assunto polêmico e delicado.

Debatíamos com muita educação. Eu, por minha vez, tentava mostrá-la que havia também um lado diferente da realidade que ela colocava, e que ela poderia estar ignorando ou simplesmente não tendo acesso a determinas informações.

Quando me dei conta de que íamos chegar em nenhum lugar com nossas opiniões, eu decidi recuar. Finalizei a conversa ressaltando um cuidado como de quem tenta catar alguns dos transparentes e pontiagudos cacos de um copo de vidro estilhaçado no chão da cozinha.

Acredito que uma das razões para esse cansaço coletivo é que não conseguimos mais manter uma conversa sensata com as pessoas que discordamos. Estamos vivendo uma hipertrofia na tolerância — e muitas vezes, usando o discurso da própria flexibilidade para isso.

Tudo pode ser menos cansativo se aprendermos a dar menos valor para o que achamos e aprendermos a valorizar mais a relação que a razão. Este é um segredo que eu mesmo tenho experimentado e tem me feito bem.

A péssima sensação de “ser o único merda”

Não é de hoje que somos ensinados a nos comparar para ter parâmetros. Estamos sempre nos perguntando: Quem é o mais rápido, mais alto, mais inteligente, mais bonito, mais forte?

A competição nos envenena sem notarmos. A questão aqui é entender quecomparações só servem para duas coisasExaltar alguém e automaticamente rebaixar outro.

Repare que espelhar-se em outras pessoas é um movimento que pode ser saudável e até nos fazer ver novas possibilidades. É diferente de quando simplesmente avaliarmos, fazemos julgamentos e criamos expectativas irreais sobre a realidade que não é a nossa.

Terei que cometer a acusação mais óbvia: É preciso ponderar que o universo das redes sociais realmente está na lista de principais causadoras desse sentimento de que o mundo todo está bem e só a gente que não.

As fragilidades ficam fora dos filtros. As tristezas podem até ser postadas, desde que dê likes. Os dias infelizes não têm hashtags nos trends. A desesperança não ganha chuva de comentários.

Ser psicologicamente maduro é saber identificar quando considerar uma visita constante da tristeza e quando nivelar um episódio ruim da vida com a ocasionalidade. Você pode precisar de ajuda para reconhecer essa diferença. Não tenha medo de procurar um suporte médico, se precisar.

Tudo vai dar sempre errado na minha vida?

Essa questão está ligada a anterior. Em algum nível psicológico, existem pessoas que realmente andam no limiar entre o pessimismo desanimador e a falta de coragem diante da inatividade constatada.

Você não é o que você faz. Muito menos o que deixou de fazer. Quando estamos inseridos num contexto amplo de atividades, temos a impressão de que o nosso mundo é o único que sempre desaba.

Acredito que perder a perspectiva da nossa história é o principal motivo que nos leva a focar em recortes trágicos da nossa vida. Conheço pessoas que conquistaram muitas coisas na vida, mas ainda estão apegadas a seus passados como quem alimenta um bicho de estimação por hobby.

Diante de uma percepção de olhar viciado em grandes catástrofes, é bem provável que você tenha o hábito de supervalorizar as demandas negativas.

Especialmente quando falamos de relacionamentos, é bastante comum trazermos experiências ruins para novos contextos. A gente é viciado em achar-se insuficiente de começar uma nova história. Acostumamos a nos ver como pessoas que não sabem amar.

A prova disso é que você ao invés de ler este trecho e buscar entender como isso tem efeito negativo em sua vida, você deve estar pensando: “É que ele não conhece minha vida. Sempre dá errado.”, “É só olhar para as minhas experiências e verá que sou uma incapaz de sustentar um amor”.

Repare. A maneira como você vasculha as evidências de algo que viveu é que te diz como criou padrões comportamentais que pode estar atrapalhando um novo contexto. Você está num círculo mental vicioso e pretende ficar.

Obviamente, que não temos como nos desamarrar dos traumas como quem se livra de uma espinha no queixo, é preciso realizar uma limpeza sincera e sistemática nas ideias que nos levam para novas práticas saudáveis evitando cometer bobagens repetidas.

Não é possível viajar para um novo lugar com as bagagens sujas de uma outra viagem. É preciso lavar, secar, passar e arrumar as malas. Demora, mas essa limpeza tem que ser feita uma hora.

“Ninguém entende o que eu estou vivendo. Sou um fracasso.”

As coisas dão errado. Ponto final. Isso não quer dizer que esteja preso aos insucessos da sua vida. Muito menos quer dizer que você é o único responsável pelas situações chatas que acontecem.

Quase sempre tenho que lidar com uma dualidade na minha mente: Ora acredito que tudo que conquistei é por pura sorte, ou uma espécie de “estar certo na hora e no lugar certo”, e ora, tenho a impressão de que trabalhei bastante para alcançar alguns resultados.

Aprender que nem tudo que dá errado em nossa vida é por causa de um regra que o universo impôs sobre nós. Isso é besteira. As contingências do mundo não escolhem a dedo quem ela deve atingir.

Essa mentalidade não só dificultava todo o meu processo de aprendizado, como me tirava a dimensão de que é normal errar muitas vezes. Sair desse lugar de entender-se como uma vítima do fracasso não é fingir que nada acontece de ruim, mas aprender a valorizar cada passo que damos rumo à superação.

Se achamos que ninguém é capaz de entender nossos sentimentos estamos no pior lugar do mundo. Cada um sofre de formas diferentes por coisas diferentes, mas todos tem aprendizados para compartilhar.

A cicatriz é só sua, mas a dor não precisa ser

É verdade que ninguém será capaz de sentir a dor que você sente, mas poderá sim te dar ferramentas pela empatia para te ajudar com o mínimo possível para deixar o seu caminho mais fácil, e por vezes, menos doloroso.

O que ninguém te conta sobre estar mentalmente fodido é que no seu caminho, cruzará com muita gente que apresenta indiferença a sua situação, desdém quanto a sua realidade, insensibilidade aos seus sentimentos, mas, por sua vez, descobrirá também muitas pessoas — gente de verdade — que poderá te curar de um dia ruim, de uma sensação de incapacidade, de uma tristeza involuntária, apenas com uma manifestação de carinho e preocupação.

É sobre isso que toda a sua vida tem que circular. Ninguém te prometeu um lugar sem sofrimento, mas também, se olhar bem, ninguém te provou que está sozinho no mundo. Sua mente está fodida agora, mas não precisa sempre ser assim.

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O que ninguém te conta sobre morar numa cidade grande

Só é possível morar em uma cidade grande diante do mais truculento e monumental exercício constante de cinismo. Fingir é um dos pré-requisitos para viver por aqui.

A gente simula — mesmo sabendo que não — que estamos aproveitando a vida conforme conseguimos. Temos que disfarçar a vigente condição precária do outro que nos aponta o nosso mais nobre egoísmo predileto. Temos que encobrir, na maior cara de pau, a nossa própria falta de interesse pela vida alheia.

Uma outra grande questão aqui é que o morador de cidade grande não sabe fazer amizade. Calma! A culpa não é totalmente dele, suas escolhas sempre o jogam como reféns da distância, vítimas da grandiosidade, cativos da falta de tempo e escravos do ofício. Qualquer outra coisa que seja torna-se prioridade fundamental.

Dirão alguns que exagero nas palavras aqui — e propositalmente faço. Simplesmente recorto: Por todos os cantos podemos flagrar pessoas anestesiadas pela sua mais infinita solidão. E mesmo que possamos justificar a invenção dos “happy hours”, como o modelo único de mais alto nível de apreço pelo outro, ele não é o modelo de amizade mais sólido.

Embora se tente, não é possível ter uma vida normal em uma cidade grande. Não há uma pessoa sequer que tenha morado nesse lugar enorme e não tenha realmente descoberto que seus limites físicos e mentais eram mais evidentes do que imaginava.

Cenas e mais cenas

Há uma inevitável depressão coletiva, um desânimo visivelmente óbvio, um abatimento público incontestável, um natural esgotamento global, um crescente estresse comum e uma melancolia nata diante da constante ansiedade. Há flagrantes por todo lado.

Nelson emoldurou uma verdade implacável: “A maior forma de solidão é a companhia de um paulista”. Como todos que vivem em uma cidade enorme, o paulista é capaz de viver sem contar horas, amar voluntariamente o que mais lhe faz mal, envelhecer sem jamais confessar — uma vez sequer — que não vale a pena viver no galope desembestado das avenidas, ternos e túneis.

A cidade grande recebe o aplauso mais injusto do nosso fetiche por produtividade. Na sua imensidão, nos ilude. Carrega a insistente tentativa apoteótica de levar o homem ao céu. A maioria das pessoas por aqui, se imagina muito importante. Uma farsa orquestrada sordidamente aceita.

No seu engano predileto, todos aqui preferem acreditar na velocidade como o protagonista do sucesso. E enganam-se por desconsiderar que a pausa é que é a heroína. É nela que estão os encontros, as alianças, os entendimentos e as afinidades.

A pior forma de solidão é a lotada

Ela nos coloca sempre na divisa dos próprios escrúpulos, nos faz viver no limite da irremediável fronteira humana. A cidade grande golpeia duramente e camufla a mão como maldade.

A incombatível vastidão das ruas matou o olho no olho. Preferiu o descuido de desacreditar que viver é dar razão as coisas simples. E nos escondeu a possibilidade de ser humanos no metro quadrado que temos sobre os pés.

São Paulo até quando? Até quando fizer sentido. Com um pouco de sorte, você pode ser feliz num lugar como esse, mas diante da realidade baforando no cangote e gritando na mente, você não é capaz nem de respirar a poluição com merecida dignidade.

O que ninguém te conta sobre viver numa cidade grande é que aqui, os cidadãos tem a liberdade de aceitar o convite dos mais puros desejos próprios, que nestas ruas a beleza de viver é interessante apenas nos primeiros olhares, mas que desfalece num enfado visual cotidiano e enjoado de tanta verdade nua.

Nestes lugares cruéis, podemos desconfiar do que sempre acreditamos e dar crédito a mais barbara e insólita incerteza. A cidade grande é um monstro que só cresce. Quem morre, a doses milimétricas de veneno diário, é a sanidade.

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O que não te contam sobre o "eu te amo" estar cada vez mais raro

Sim, há quem tenha vivido um tempo em que o “eu te amo” era mais popular. Às vezes, esses dizeres eram inevitavelmente inconsequente, ligeiramente abastado, mas sempre com endereços fixos.

A gente dizia “eu te amo” sabendo que amava. Desde a mais insignificante pessoa da família até os mais avassaladores amores de corredor, a gente sentia que amava, e isso era o suficiente para ir logo desembuchando a trinca de ouro mais famosa da retórica.

A banalização do “eu te amo” criou uma geração ressabiada em dizer o que sente. Com medo das três combinações de verbetes muito almejados dos ouvidos, entramos num tempo de escassez expressiva. Como um terreno de garimpo já bem explorado.

Em tempos de solidão coletiva, acostumamos com a falta. Mas além disso, entramos numa confusão massificada que resultou num terreno moderno ruim para florescer o amor.

A inconsistente crise do “Eu”

Conhecer-se sempre foi o maior desafio do ser humano. Saber quem somos é uma das pergunta mais feita desde que o homem notou-se como ser, mas também é uma das únicas questões que menos encontramos respostas concretas. 

A maioria de nós tem só um pequeno flash da compreensão e do entendimento de si. Isso nos incomodou sempre, mas nem todos realmente se importam com esse olhar para dentro de si. Todo mundo tem seus escapes e suas maneiras de fugir de si.

Apesar da crescente onda da psicologia aplicada, da meditação e de todos os métodos de autoconhecimento estarem em crescente popularidade — e muito disso é devido ao diagnóstico incontestável da falta de sanidade coletiva em que vivemos e da evidente crise na saúde mental padrão — ainda assim, há esconderijos pessoais que a gente não ousa entrar para entender. 

Lembro de uma amiga que um dia me disse que gostaria de mudar de país para esquecer a crise pessoal que estava vivendo. Lembro de ter-lhe dito: “Não vai adianta, querida. O seu problema é que onde quer que esteja, você estará lá!” Ou seja, o problema dela é lidar consigo mesma.

Ter a dimensão completa de si é um dos trabalhos mais difíceis e dolorosos que alguém pode insistir em procurar. Vasculhar-se pode ser realmente doloroso, afinal, o espelho da alma reflete tudo inclusive aqueles inevitáveis limites que temos que encarar.

Por um outro lado, não devemos nos acovardar diante das descobertas. Quando somos ousados para deixar de olhar na superfície e perceber que, apesar do baque de encontrar-se ser grande, isso pode ser realmente uma grande viagem para corajosos.

Além disso, precisamos parar de se tornar pessoas que criam e projetam as suas próprias personalidades de maneira artificial, inexata, virtual e abandonar essa versão impalpável em que acabamos acreditando diante do circo que nós próprios montamos para fingir ser.

A consciência de si, ou melhor, do “eu”, nos ajuda também a nos recolocar diante de uma mundo sem significado. Encontrar nosso lugar diante das pessoas, da nossa realidade vivenciada e do outro também é fundamental. A gente não sabe o que é “eu”. 

Esta é a primeira razão que não temos mais a intrepidez de olhar bem diante do olho de alguém e revelar o amor pelo outro em palavras. Quem não sabe sobre si, não sabe o que quer.

A falta de consciência do “Te’

Bem, se não damos conta de olhar para si mesmo, quem dirá do outro. Sobretudo, em um mundo onde a preservação de si próprio é uma religião destemida e crescente, não há espaço para o outro.

Perguntei a um amigo que trabalha no ramo alimentício se era apenas impressão minha ou antigamente os produtos eram enormes e agora eles vêm diminuindo.

Ele me confirmou, sem pestanejar, que muitas indústrias estão realmente investindo em produtos e embalagens que tenham pequenas porções. A razão é simples: O mundo está cada vez menos comunitário. Se estamos vivendo uma vida mais sozinha, não faz sentido ter produtos tamanho família. Bingo.

Não só a gente tá se acostumando a viver sem o outro como também isso gera uma individualidade problemática. Minha avó sempre dizia que o mundo tem a filosofia prática do: “Pouca farinha, meu pilão primeiro”. Isso quer dizer, a gente não só vive mais desacompanhado como também liga cada vez menos pra condição do outro.

Nesse sentido, entrar um cinismo diante dessa verdade que nos afunda mais nesse buraco da falta de senso de comunidade. Sem dúvida, o mais certeiro caminho para a infelicidade é a trilha do egocentrismo. 

Embora esta percepção crítica seja uma realidade muito conhecida pela simples leitura do contexto atual, ainda assim, veneramos sem perceber os modelos que bonificam a ideia de isolamento, dizendo sempre assim: “Bem, o mundo é assim, não é? O que eu posso fazer?”

A pergunta que não quer calar continua gritante: “Por que todo mundo se sente sozinho, mas mesmo assim realiza pouco para mudar?”. A resposta é certeira: É justamente porque perdemos de dimensão a realidade coletiva. 

Criamos um mundo para lutar as nossas próprias lutas, para conquistar as nossas próprias coisas, para lidar apenas com as nossas questões, para viver o “eu mesmo” sem interrupções. Essa independência pode parece protetora num mundo que não aprendeu a frustrar-se. A auto-preservação nos impede de avançar.

Ao perdemos a dimensão do outro, não faz mais sentido dizer “eu te amo”. E a razão é básica: Não é viável amar sozinho. Nem mesmo a si. Parece óbvio, mas esquecemos: Amar o outro é prerrogativa básica para existir “Eu te amo”.

O desconhecimento do “Amo”

Eu vivo perguntando para as pessoas: “Você acha que já foi amado de verdade na vida?”. A cena é sempre a mesma: A surpresa no olhar de quem nunca pensou sobre isso, uma pausa pontual e depois um breve balbuciar: “Não sei. Talvez.”. E sempre concluo dizendo: “Se você tivesse sido, saberia com certeza.”

Para muita gente, declarar amor hoje é como estar pelado numa grande avenida. O amor tem uma faceta de vulnerabilidade que não estamos acostumados a sentir. Ele é realmente o mais irrastreável e desejado dos sentimentos desconhecidos.

O amor é de uma nudez impressionante. E aqui tem um ponto a esclarecer: Não falo de sexo, falo dessa dimensão que o amor tem de nos colocar diante do outro sem reservas. De nos escancarar para o outro a partir de uma inconveniência ímpar. 

É por isso que não sabemos reconhecer o amor. Não queremos mais essa fragilidade. As pessoas não querem escolher errado, então elas atrasam qualquer decisão. Dizer que “eu te amo” para um parceiro em potencial pode significa para elas que não pode dizer o mesmo para outro. E isso nos acovarda.

Entende que se estamos tendo dificuldade de identificar o que é amor e de sentir-se amado, não faz sentido dizer a tríade verbal do “Eu te amo? Esta também é uma das razões da carência de um “eu te amo” despretensioso?

Como recuperar o “Eu te amo”?

O que não te contam sobre o “eu te amo” estar cada vez mais raro é que, na teoria, precisamos ir atrás de entender quem somos, aprender a identificar o que o outro precisa e saber reconhecer no amor a sua mais pura praticidade existencial. 

Não saber-se reconhecer significa aceitar-se com uma mediocridade terrível e desistir de tentar uma evolução pessoal mais produtiva e benéfica a si próprio. É passar a vida sem ter sido o que poderia ser.

Não dar um passo em direção das outras pessoas por egoísmo, por receio, por trauma, por qualquer razão que seja é assumir que a sua sensação de auto-suficiência te empurrou para uma vida sem legado.

E por último, não ser capaz de amar é assumir que eliminou uma parte fundamental da nossa humanidade. É dizer que teve uma vida sem construir uma ponte qualquer com alguém. É ter apenas a si mesmo como uma trágica referência única.

 O mais curioso disso tudo é que a geração que arrota liberdade, que diz viver mais intensamente, que se envolve entre si sem se preocupar tanto com as tradicionais amarras morais é ironicamente a que mais respeita o “eu te amo”, mas a que menos ama intensamente. Vai entender. 

Ninguém mais sabe o que é o “eu”. Ninguém mais sabe o que é o “te”. Ninguém mais sabe o que é o “Amo”.

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A vida é sobre planejar tudo, mediar o que der e controlar absolutamente nada

Sentei na mesa do Shopping na companhia do meu cappuccino. Ao lado, nitidamente abalados, dois jovens choram baixinho.

O rapaz disfarça o rosto vermelho esfregando os olhos com a mão. A garota controla o escorrer do nariz olhando imóvel para o celular ao mesmo tempo em que tenta se acalmar.

Ambos permanecem com aquela cara típica de frustração. Começo a chutar mentalmente que eles talvez estivessem passando por uma crise de relacionamento.

Por pura arrogância e um pouco rabugento, menosprezo a dor juvenil que sofrem. Imagino uma briga convencional e cotidiana de casal. Ela estava mal. Me dou conta que estou sendo babaca.

Resolvo não me intrometer — e quem me conhece sabe o esforço que é para mim não se importar — apenas continuo escutando. A garota lamenta: -“Mas, eu realmente amava ela, amor. E agora?”.

O garoto sem qualquer traquejo senta na ponta da cadeira e a abraça forte. Em silêncio absoluto, passa a mão na cabeça da moça como quem ajeita um lençol pela manhã.

-“Ela quem?”, me pergunto. A menina prossegue com a voz da derrocada: -“Eu sei que me assustei no começo, mas depois que vi nossa bebê no vídeo, eu me apaixonei por ela, eu sonhei com ela e ela não está mais aqui”.

A barragem dos olhos rompeu-se. A dela, do seu companheiro e as minhas. Talvez até as de Deus. Ela havia perdido um bebê. A notícia era recente. Meu corpo inteiro arrepiou. Duas crianças lamentando a morte da terceira.

No auge da minha sensibilidade, ela dá o golpe de misericórdia: -“Ainda não me recuperei, amor”. Abaixei minha cabeça e tive vontade de implorar a ela:  - “Não se recupere. Nunca, nunca mais se recupere. Apenas sofra menos, cada dia menos, até que tudo saia do primeiro plano. É o máximo que vai conseguir, querida”. 

Fiquei imóvel. Não tive coragem de fazer nada. Fiquei mudo. Não balbuciei uma só palavra. Assisti todo aquele sofrimento sem ter forças para conseguir engolir meu chocolate extra.

Apenas tive que lidar com um vislumbre emergente que me surgiu, a mais completa verdade gritando no meu coração: 

“A vida é sobre planejar tudo, mediar o que der e controlar absolutamente nada.”

Os planos da vida são só os planos da vida

Admiro demais quem tem esse papo de que a vida não é feita para ter planos. Mas, a verdade é que não ter planos é um risco eminente da inocência.

Existe uma linha muito particular e fina entre levar a vida com leveza sem fazer dos planos um sargento autoritário da sua vida, e carregar em si a atitude de não ter absolutamente nenhum plano para viver.

Não caio mais na ilusão de acreditar que um plano específico não pode mudar. A vida inteira muda para sempre.

Nossos planos são apenas pequenos esboços leves de um traço irrastreável de futuro. Na vida, vamos fazer muitos e muitos planos, mas quase todos podem e vão mudar de rumo.

É claro que qualquer decisão fica mais segura com um planejamento, mas são os estalos que mais cedo ou mais tarde acontecem, que nos empurram para o rumo da nossa história.

Nenhuma ideia pode ser boa o suficiente para funcionar sem um plano, quase nada bem feito nasce da mais absoluta espontaneidade. Não existem rumos sensatos que partem de nada.

Uma boa parcela da vida é feita de tentativas e erros, de fracassos e esgotamentos e mesmo que tenhamos o planejamento de abraçar todos que amamos, de realizar tudo que almejamos, de atingir todos os sonhos que temos no mundo, a vida implacavelmente não está nem aí.

Não é sempre que poderemos nos despedir com classe de todos que amamos, que teremos a oportunidade de pedir desculpas pelas nossas próprias imbecilidades, que poderemos resgatar o que ficou ferido para trás, que vamos dormir e simplesmente encontrar o amanhã. A vida não obedece planos.

Faça o que está no seu alcance agora

Faça tudo que é possível com o que tem. Este é o segredo para lidar com algo que saiu do controle.

Não adianta espernear, nem punir-se, nem buscar culpados, nem supor qualquer teoria maluca que possa tentar explicar, quando algo dá errado, é bom que procure apenas continuar na firmeza com que se possui. Se ela faltar, não se esconda.

A pior coisas que podemos fazer em momentos difíceis é fingir força. Ninguém deveria ignorar o que sente, mas todo mundo deveria preocupar-se em gerir emoções. Aqui está a grande sacada, a grande oportunidade de transformar momentos ruins em algo um pouco mais leve. 

Ninguém disse que a vida seria fácil. A gente apenas precisa ter em mente que é bom estar acompanhado de pensamentos bons, de gente que nos ajuda, de boas experiências, de momentos melhores. Foi Woody Allen quem disse: “A realidade é dura, mas ainda é o único lugar onde se pode comer um bom bife”.

Apenas aja. Apenas faça. Apenas não desista. Apenas não seja vítima da sua própria mentalidade tóxica. Apenas seja corajoso consigo mesmo. Apenas ajude-se. Apenas saia do lugar que acostumou a estar. Por você. Pelos outros. Pela vida em si.

É verdade que nem tudo tem solução. Algumas marcas serão pesadas. Alguns arranhões podem doer muito. Algumas feridas nunca mais saem. No entanto, apesar de tudo, acostume-se a gerir em favor de mediar o que der.

Perca a ilusão do controle

Não há contingências da vida que possam ser controladas. Mesmo os ambientes mais supervisionados. Até a prisão de segurança máxima tem fuga.

A morte é a mais clara e objetiva demonstração de que não temos controle sobre nada. O ser humano é o único que tem a arrogância de tentar coordenar a vida, mas não se dá conta que mal consegue controlar o músculo numa dor de barriga ferrenha. 

Perder o delírio da gerência total da vida é descer do salto e finalmente aprender que não vamos ser mais fortes que a vida, que não vamos conseguir regular os hormônios, que não vamos dar conta de monitorar nosso futuro, vigiar o que os outros pensam sobre a gente ou moderar a nossa felicidade o tempo inteiro.

Devemos sim levar os detalhes da vida a sério, aprender a não ignorar o previsível, a respeitar a antecipação, a valorizar a intuição, mas deveríamos jamais ceder a miopia do controle.

Nesse mundo em que os planos não garantem nada, onde as contingências nos empurram para as crises e a vigilância não traz segurança, temos que aprender a enxergar o que está gritante bem na nossa cara.

Aprenda sobre si, sobre o mundo e sobre os outros. O tempo inteiro. Reze sem ter religião, ame sem ter validade e agradeça sem ver uma única razão.

A vida não é o melhor lugar do mundo, mas é o único que temos. Planeje sempre, seja mediador quando precisar e não tente controlar a vida.

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O que ninguém te fala sobre não ter medo de ser a si mesmo

Sento com amigos na mesa do bar — que é a minha ágora filosófica — e percebo que estão falando sobre ter coragem.

Uma amiga muito querida, com o maior tom de respeito do mundo, me pergunta: 

 — Como que é mesmo aquela sua teoria/história que você se tornou um ex-medroso?

 — O correto é ex-covarde! E não é invenção minha não...tenho que corrigi-la para não cometer injustiças — …essa história é do Nelson, o Rodrigues.

Há essas alturas, tinha apenas um dedo de gole no meu copo. Faço sinal indicando que preciso que encham. Dou uma bicada gulosa até a espuma ficar no meu próprio bigode. Limpo apressadamente com os punhos e disparo:

 —  Olha, o que houve foi que descobri que não tenho mais medos bobos.

O silêncio assemelha-se a um constrangimento ímpar do confessionário. O espanto inicial diante da minha frase foi logo se transformando em rostos viciadamente desconfiados. 

Era como se eu, num descuido acidental, tivesse cometido o pecado da inocência. Antes que desse pano para manga com conclusões prévias e já sentindo o cheiro da ansiedade no seu ápice, decido explicar: 

Vocês têm alguns minutos sobrando aí? Essa história é realmente boa demais”.

Eles se entreolham como um juri culpado e decidem me dar o benefício da dúvida. Nesse ponto, a curiosidade era maior que o tédio.

“ — Olhe bem para mim. O que vocês vêem?

Faço mais um pausa breve. Em seguida, não paro mais de falar: 

 — Eu sou um garoto de 28 anos, mas que parece ter vivido muito mais do que isso. Outro dia, estava pensando que, depois de uma certa idade, tive poucos medos reais. 

Prevendo que iam tomar minha fala como um discurso heroico de autoproclamamento - e esse papo de gente-herói é tudo besteira - insisti em permanecer com a palavra:

 —  Quase nada realmente me apavorou depois de algumas experiências. Hoje, quando olho para minha vida e vejo o tanto que ela mudou, evoluiu, sobreviveu, se perdeu, transformou,  poucas coisas têm o poder de me assustar.

Comecei a missa. Botei-me a explicar que, ainda na época do vestibular, tive a coragem de explicar para meus pais — depois de um ano fazendo cursinho totalmente focado em biológicas —  porque havia decidido que ia migrar minha inscrição do curso de biologia para jornalismo nos 42' do segundo tempo. (Para ser exato, mudei bem na hora de preencher o formulário da inscrição.)

Esta coragem, obviamente, resultou precisamente na minha profissão. E com ela, veio a satisfação de transformar o que mais amo fazer hoje em ofício.

Não me vejo fazendo mais nada desta vida. Poderia sim ter sido um bom biólogo, mas jamais seria feliz. Sem aquela coragem, me tornaria um profissional frustrado pelas escolhas alheias.

Não convencidos com meu pequeno exemplo juvenil, tive que sacar outra carta mais alta: Expliquei a eles que, mais tarde, por excesso de coragem, decidi não mais despedir da mulher que amava e quando vi, estava me casando aos 25 anos de idade.

Ali na mesa, lembrei meus contemporâneos, da insanidade que é em nossa época, tomar tal atitude.

Concordamos todos que isso era realmente uma demostração louca de coragem. Era quase como confessar um crime sem justificativa. A valentia começou a fica evidente. 

Continuei explicando que encontrar o que pensava ser a mulher da minha vida, ao invés de me colocar diante do medo inibidor, fez o efeito contrário. Foi a gasolina pura. Não tive dúvidas um dia sequer sobre esta decisão. Passar os dias da vida ao lado de um amor requer uma dose grande de coragem. 

— Mas nem um pinguinho de medo?, me perguntava um deles tentando ainda encontrar uma fraqueza contra isso tudo.

Os contei que realmente não fazia ideias do que ia vir, mas que andava sem receio do futuro incerto, sem me preocupar como íamos conseguir pagar todas as contas durante anos. Fomos corajosos. Pelo menos diante da nossa geração inteira.

Tive que explicar que o medo nunca foi um problema pra quem é convicto do que quer.

Contei que antes, consultamos umas pessoas, fizemos umas contas numa planilha do Excel, arrumamos um outro bico de fotógrafos, botamos a mão na massa no que precisava colocar e conseguimos, com a energia da nossa juventude, patrocinar de maneira milagrosa boa parte dessa loucura de unir-se. Não me arrependo de nada.

Anos depois, um golpe. Forte. De derrubar campeões. Tive outro encontro forçado com a coragem. Descobri que não existe amor imbatível, infinito e ilimitado. 

Até mesmo os amores que se dão bem podem um dia não existirem mais, não resistirem viver mais com objetivos distintos, e por melhor que tudo pareça estar, algumas coisas podem sair do controle.

Mas e a tal coragem? Meu amigo, se você soubesse a coragem que tem que ter para deixar um amor de anos ir embora, não me perguntaria nunca mais sobre isso.

 — É barra, né?, exclamou um deles.

Foi ai que contei que ao invés de choramingar pelos cantos, tratei de guardar as melhores lembranças, frases, momentos e tratei de invocar a coragem para deixar as muitas bagagens que carregava de lado.

Disse a eles que o amor me deu um soco forte, mas nunca tive medo de apanhar, que ele sempre perdia para minha convicção, que eu nunca achei que fosse ganhar todas as lutas, mas que sabia o que queria.

Eu já tinha falado uns 10 minutos. Tá, talvez 20. Lembre-me de dar mais uma gole no copo que agora tava quase em temperatura ambiente. Viro tudo que tava nele e repito o sinal pedindo mais.

Faço silêncio imaginando que, nessa altura do papo, eles havia cansado de me ouvir. A menina da ponta da mesa deflagra: 

— Ah, e também,  infelizmente, teve aquele dia, né? Sabe do que estou falando..

Dou um pequeno sorriso e falo: 

 — É, o dia que perdi uma das melhores pessoas da minha vida.

 Recontei a história toda. E eles ficaram me olhando sem saber o que dizer.

Tive que concluir: 

 — Entende? Depois de tudo isso, amigo, ia ter medo de que? De ser mal interpretado? De ser julgado por uma simples opinião? De deixar de falar de algo que acredito? De como vão me avaliar quando falo das coisas que sou convicto? De ter sido casado? Do meu passado? Da solidão? Da sensação de fracasso? Do medo do que estão por vir? De ter minhas percepções sobre Deus e a fé? De falar sobre meu olhar político do mundo? Da morte? Medo de gente que nem sequer sabe o que pensa? 

O que ninguém te fala sobre não ter medo de ser a si mesmo é que para ter coragem, têm que ter vivido um pouco, sofrido muito e encontrado consigo mesmo neste caminho.

Eu me dei conta que não tinha mais medo de muita coisa. Finalizei explicando para eles que, hoje, eu posso apontar para cada um que se esconde atrás da sua falta de atrevimento e sustentar a minha insolência, patrocinar a minha ousadia e invocar a minha petulância, porque eu, finalmente, sou um ex-covarde. Conforme Nelson dizia.

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O que ninguém te conta sobre o cansaço que o amor moderno traz

Boa parte do amor é euforia. No entanto, nos dias de hoje, nem tudo acaba bem quando um amor demonstra empolgação demais. Explico. Entendemos que “amar demais” é um problema e leva fatalmente ao fim de um amor.

É claro que você já viveu aquele sentimento de conhecer alguém, sentir que seu coração foi invadido por algo bom, ter a impressão de que poderia muito bem permanecer na companhia daquela pessoa para a vida toda, mas inexplicavelmente ver um dos dois optar por, diante do crescente interesse em ficar juntos, diminuir drasticamente a velocidade e o andamento de um relacionamento.

Chega um momento em que ambos colocam tudo em marcha lenta e passam a economizar afetos, medir palavras, evitar exposições sentimentais, e com isso, induzir um coma proposital e induzido aos amores recém nascidos. 

 Eu te digo de cara — e sem medo de errar — que: Isso tudo é puro medo. Na verdade, são tipos de medos:

(1) Aquele mais clássico de investir profundamente numa relação e ter que assistir tragicamente algo sair errado no futuro, e não dar conta do esforço maior que é recuperar-se. É aquele medo de um desconhecido sentimento previamente projetado;

 (2) E o outro terror comum diz respeito a ter o receio de mudar toda a sua vida em função de uma nova experiência de amor. Isso é, já que os dois deram tão certo, um deles acredita que não dará conta de manter aquilo, ou que não quer abrir mão de outras escolhas, e agora, só pensa em aproveitar o tempo que der — e geralmente é pouco — para depois fugir de maneira discreta daquela “pressão”.

As situações flagrantes acima, apenas demonstram que estamos no mundo em que expor emoções demais num relacionamento pode despertar medos bobos nas pessoas e criar uma relação medrosa fadada ao insucesso antes mesmo da sua vida. 

A lógica moderna é uma só: se importar ou não

É bizarro pensar assim, mas receio em dizer que esta é esta a maior das realidades no que se trata de relacionamentos atuais:

Quanto menos se importa com alguém, mais amarrado a pessoa pode sentir-se a você. Quanto mais se dedica a externar sentimento, menos interessadas as pessoas podem ficar em você.

A questão que envolve toda essa situação é mais complexa ainda. Ela torna pessoas boas em reféns, e as intenções sinceras de amor são sempre menosprezadas. 

Conheci uma história, outro dia, de uma pessoa que me disse: “Bem, ele é uma pessoa boa, um sujeito realmente querido, não me faz mal algum, sempre está aqui quando eu preciso, eu até gosto de estar perto dele, de rir e ver o quanto ele é um amorzinho, mas sabe, não gosto de como ele se dedica a mim e não sei se quero ficar com ele por isso. Talvez ele mereça alguém melhor que eu.”

Este comportamento é assustadoramente comum. Mas, creio que aprender a amar alguém não deveria ser um sacrifício. Se alguém, voluntariamente, insiste em permanecer te amando, você não deveria sentir-se mal com isso.

Mas por quê preferimos alguém que vive jogando psicologicamente conosco?

O lance está em quebrar padrões. Amores desastrosos nos atraem por causa disso: Queremos barreiras. Queremos nos sentir confusos. Isso nos dá a sensação de vitalidade.

Quando temos um amor muito “perfeito”, nosso cérebro tende a gerar a sensação ruim de desconforto que a falta de nos traz. Temos a ideia meio de que “merecemos o amor que conquistamos”, e isso, justifica a nossa busca e permanência dentro de um amor confuso ou inexato.

Apesar disso, creio que se você tem que procurar razão para amar alguém em lugares além da satisfação e da reciprocidade, isso por si só, deveria te mostrar a não investir um minuto a mais naquilo.

Se você tem que perguntar-se se alguém é a pessoa ideal para você, então é bastante provável que você não goste dessa pessoa, mas sim do que ela pode ou oferece para você. Eu sei, a denúncia aqui é grave.

Como (tentar) lidar com essa questão

A coisa mais importante é você sempre saber em que estágio está com a outra pessoa e respeitar este degrau. 

Não estou falando de ter que necessariamente rotular um determinado status, mas sim em compreender que se estão juntos para construir algo, os dois precisaram investir naquilo igualmente. Agora, se simplesmente não significam nada para o outro, ter coragem de ser honesto.

Ninguém deveria estar investindo tanto tempo e energia em algo que não tem reciprocidade.

Além disso, existe aquilo que chamamos de responsabilidade afetiva, ou seja, é inevitável relacionar-se com alguém a fim de construir algo positivo nela e ela em você de maneira indiferente.

É ser humano o suficiente para responsabilizar-se pelos sentimentos que pode causar no outro e aprender a gerir expectativas que naturalmente cria em outros.

Basicamente, é saber se colocar no lugar do outro e entender o que ele espera de você, não só para retribuir naturalmente, mas porque é o que você identifica que também quer.

Quando conhecer alguém, por favor, apenas seja gente

O mais importante quando você conhece alguém e acredita que podem evoluir para algo realmente significativo é ter cuidado sim com a velocidade das coisas andando sempre no ritmo certo, mas administrar nossos medos convencionais e fazer questão de entender o do outro.

É, essencialmente, aprender a não esconder sentimentos por capricho, a não fingir emoções para persuadir, a ter coragem de ser a gente mesmo sem que isso danifique o outro, a não tomar decisões antecipada sem antes conversar com a outra pessoa, a não deixar as impressões e preconceitos pessoais falarem mais alto.

E por último, aprender que fazer questão de estar sempre no mesmo nível de afeto que o outro precisa não é trair-se, mas sim doar-se para um fdesejo mútuo. Você sempre pode fazer mais do que acha que pode.

O que ninguém te conta sobre o cansaço que o amor moderno traz é que estamos tornando algo profundamente bom em um fardo mental muito grande para nós e para os outros.

O amor moderno precisa urgente de uma reciclagem mental. E necessariamente, tem que sair da mentalidade individualista e ser mais generoso com o outro.

Amar a si mesmo não é amar-se mais do que ama o outro, mas é amar-se, fundamentalmente, enquanto também ama o outro.

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